São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005

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Brasil oscila entre suas pretensões regional e global

LEILA SUWWAN
DE NOVA YORK

"É a pureza de seu idealismo que impele o Brasil a criticar as Nações Unidas." Foi assim que, em 1949, o país estreou na tradição de ser o primeiro orador da Assembléia Geral da ONU, questionando principalmente o "abuso" do direito a veto dos membros permanentes do Conselho de Segurança.
Hoje, menos idealista e mais pragmático, o país busca um assento permanente no CS. O fracasso dessa empreitada neste ano coloca, para muitos, o Brasil num momento de definição de rumo, entre o papel de destaque no desenvolvimento ou na segurança, entre a liderança regional ou global.
Para o professor Edward Luck, especialista em ONU da Universidade de Columbia, o país deve enxergar essa dicotomia. "Por muitos anos, o Brasil buscou um papel mundial, não um papel regional, e sempre teve um perfil autônomo, não alinhado. Isso de certa forma prejudicou o país. Não tinha o peso da liderança na região nem força suficiente para jogar o jogo das superpotências", avalia Luck.
Para ele, o fracasso do G-4 (Brasil, Alemanha, Japão e Índia) em reformar o CS e obter assentos permanentes pressiona o país a focar os objetivos de sua diplomacia. "Se quiser os votos e apoio dos vizinhos, precisará ser mais cooperativo. Mas não precisa disso se a idéia for ser uma liderança global localizada na América Latina."
O embaixador do Brasil na ONU, Ronaldo Sardenberg, afirma que a reforma é imprescindível e avançará. Para o governo brasileiro, são necessárias lideranças em várias frentes: desenvolvimento, comércio, segurança e ajuda humanitária. "[A reforma] continua em discussão e deverá passar por uma etapa decisiva em novembro. A estrutura do Conselho de Segurança está ultrapassada", disse Sardenberg. O Brasil ocupa pela nona vez posto de membro não-permanente do CS.
Para o professor Maurício Font, da City University de Nova York, o Brasil age de forma pragmática, buscando espaço para conquistas que lhe interessam. "O Brasil interage com as superpotências nas áreas que afetam seus interesses econômicos. É o caso no comércio internacional", disse Font.
No comércio, especialmente em disputas sobre subsídios agrícolas, o Brasil tem reconhecida liderança e age muitas vezes como porta-voz contra as práticas norte-americana e européia.
É assim em várias áreas do desenvolvimento econômico. Em 45 dos últimos 60 anos da ONU, o país participou do Conselho Econômico e Social e, mais recentemente, lançou a Ação Contra a Fome e a Pobreza.
Se em 1959 o chanceler Oswaldo Aranha afirmou na tribuna de abertura da assembléia que o Brasil não tinha "aspirações que não caibam todas dentro de nossas possibilidades e fronteiras", hoje o papel de liderança internacional é a meta, com busca de novas alianças Sul-Sul na África, no Oriente Médio e na América Latina.
O Itamaraty destaca a missão de paz no Haiti, chefiada pelo Brasil, além das missões em Angola, Moçambique e Timor Leste. "São insustentáveis e precisam ser revertidos os desequilíbrios mundiais entre países pobres e ricos", resume Sardenberg.


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