São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 1998.



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SOBREVIVÊNCIA POLÍTICA
Líder dos EUA supera episódios embaraçosos que o desafiam desde sua 1ª campanha presidencial
Mago da imagem, Clinton resiste a escândalos

de Washington


Bill Clinton é muito bom de imagem. É verdade que tem excelentes assessores. Mas a maior parte de seu estilo vem dele mesmo.
Só alguém com esse extremo talento seria capaz de sobreviver a problemas tão dramáticos como os que ele tem vivido desde o início de sua carreira política e ser duas vezes eleito presidente dos EUA.
Algumas de suas qualidades não lhe exigem muito esforço: ele é jovem, considerado bonito pela maioria das mulheres e simpático pela maioria dos homens. Seu jeito carinhoso ao lidar com as pessoas também parece natural.
Outras demandam uma enorme força de vontade. Clinton não sabe o que é preguiça. Trabalha de maneira intensiva o dia inteiro. Lê muito e classifica as informações com impressionante precisão.
Na campanha de 1992, ultrapassou diversos obstáculos. Por exemplo, no famoso caso de Gennifer Flowers, uma cantora de cabaré que arrumou emprego público em Arkansas depois de supostamente ter tido um caso de 12 anos com o governador Clinton.
É verdade que a acusadora dispunha de pouca credibilidade. Mulher vulgar, ainda aceitou ter seu caso patrocinado por um jornal sensacionalista de Nova York, que comprou a exclusividade da história. Mas ela vinha muito bem armada, até com fitas de conversas telefônica íntimas com um homem que, se não era Clinton, soava quase exatamente como ele.
A resposta de Clinton foi comparecer a um dos programas jornalísticos de maior audiência do país, "60 Minutes" (na rede CBS), com Hillary, negar as acusações, mas admitir eufemisticamente ter "provocado dor" a sua mulher durante o casamento, considerar os problemas superados e partir para a ofensiva: "Nenhum homem público na história deste país disse coisas tão íntimas ao povo como eu fiz hoje". Bingo.
Quando as pesquisas começaram a mostrar que os eleitores o consideravam frio demais, surgiu, de óculos escuros, no show de TV de Arsenio Hall, um humorista negro muito simpático, e tocou sax.
Conseguiu convencer seus opositores, George Bush e Ross Perot, a participarem de um debate fora dos padrões tradicionais, com perguntas do público num auditório. Deu um espetáculo de simpatia e espontaneidade. Ganhou a eleição com esses lances e com seu trabalho estóico de ir a centenas de emissoras de rádio e TV, tratar dos assuntos de cada comunidade.
Ressaltou sua imagem de homem comum e simples, de fora do círculo do poder, andando de ônibus em vez de avião ou limusine. Explorou com habilidade a imagem familiar, mostrando a filha, Chelsea, apenas em momentos muito especiais e escondendo ao máximo o irmão problemático.
No poder, deu suas escorregadas iniciais. Conturbou o aeroporto de Los Angeles para ter o cabelo cortado a bordo do US Air Force One por um cabeleireiro de estrelas.
Meteu os pés pelas mãos ao demitir os funcionários do escritório de turismo da Casa Branca e substituí-los por amigos de Arkansas.
Mas aprendeu logo a lidar com Washington. Deixou os velhos amigos para trás e contratou profissionais competentes para recompor sua imagem. Perdeu a maioria no Congresso. Mas se reelegeu, graças a um adversário fraco e idoso e a seus méritos.
1997 foi ruim em termos de imagem. Mas 1998 prometia ser melhor. Adotou um cachorro e ganhou o aplauso de 50% dos norte-americanos que são donos de cães (os outros 50%, donos de gatos, já o aplaudiam).
Livre de eleições, desviou seu governo um pouco à esquerda, anunciando incentivos a creches nos locais de trabalho, ampliação da previdência e expansão dos Voluntários da Paz. Ia bem até o caso Monica Lewinsky.
Transar com uma moça quase da idade da filha e na Casa Branca, prestar falso testemunho e tentar comprar o silêncio dela: mesmo um mago da imagem terá problemas para sair dessa sem se machucar. (CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA)


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