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PODERES AMEAÇADOS
Chefe do Judiciário afirma que tribunal se autodissolveu ao aceitar interferência da constituinte
Presidente da Corte Suprema renuncia
da enviada especial à Venezuela
A presidente da Corte Suprema
de Justiça da Venezuela, Cecilia
Sosa, renunciou ontem ao cargo
depois que os juízes acataram,
por 8 votos a 6, uma decisão da
Assembléia Nacional Constituinte que, na prática, suspende a
atuação da própria Corte.
"Dirijo-me ao mundo democrático e em particular aos democratas de meu país (...) porque a
Corte violou o Estado de Direito e
avalizou a ingerência da Assembléia Nacional Constituinte sobre
o Poder Judiciário", disse ela à imprensa.
Segundo a juíza, a mais alta Corte da Venezuela se "autodissolveu". "Ela se suicidou para evitar
ser assassinada, e o resultado é o
mesmo: Está morta", disse.
Em manifestações anteriores,
Cecilia Sosa opinara que a constituinte poderia até modificar o sistema judiciário, mas só depois de
elaborada a nova Constituição,
não durante os trabalhos.
A juíza vinha recebendo discreto apoio do Supremo Tribunal Federal do Brasil. É vista com simpatia, inclusive, pelo presidente
dessa Corte, Carlos Velloso, preocupado com a ingerência do governo, via constituinte, sobre o
Poder Judiciário venezuelano.
O presidente Hugo Chávez perde duplamente com a renúncia
de Sosa. Ela não fazia oposição ao
seu projeto de renovação da Venezuela, em alguns casos até o
elogiava. Só reagia duramente ao
fim da autonomia do Judiciário.
O discurso de Chávez, com o
qual obteve cerca de 56% dos votos, é contra a corrupção e os corruptos. Cecilia Sosa não se encaixa nesses casos. Ao contrário, tem
uma ótima imagem em Caracas e
pode se transformar numa opositora poderosa.
Outros focos de reação a Chávez
são a imprensa local e setores do
empresariado. Vicente Brito, presidente da Fedecámaras (uma espécie de federação das indústrias), critica abertamente o "Projeto de Constituição Bolivariana"
apresentado pelo presidente à
constituinte.
Em entrevista ao jornal "El Universal", um dos principais do
país, ele disse que o projeto ameaça a propriedade privada, pois
prevê desapropriações e a condiciona a uma "função social".
Em entrevista à Folha (leia na
pág. 1-13), Chávez desprezou seus
opositores, lembrando que tem
cerca de 80% de aprovação popular, o que significa apoio em todas
as camadas sociais, inclusive na
elite acadêmica e empresarial.
O presidente acusou duramente o Judiciário de estar infiltrado
pela corrupção, mas negou que
haja ameaça à propriedade privada no projeto de Constituição.
Chávez tem sido politicamente
pouco cauteloso, abrindo várias e
fortes frentes de atrito simultâneas. Endurece com os EUA,
anuncia disposição de dialogar
com a guerrilha colombiana, não
negocia com o Judiciário.
(ELIANE CANTANHÊDE)
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