São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2010

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CLÓVIS ROSSI

Chávez ganha com afeto de pobres


Uso da máquina pública, do Exército e uma oposição acuada não são a completa explicação para sua vitória

CARACAS - ATÉ a oposição admite que o presidente Hugo Chávez fará a maioria na Assembleia Nacional a ser eleita amanhã. Na melhor das hipóteses, espera chegar a 67 das 165 vagas em jogo, o que impediria o presidente de governar por decreto, o mecanismo pelo qual toca à frente seu projeto de "socialismo do século 21".
A nova vitória de Chávez será, se confirmada, a 13ª em 15 consultas populares, incluídos referendos, nos 11 anos de reinado.
Chávez ganha porque usa impudicamente a máquina pública? Sim. O Conselho Nacional Eleitoral acaba de divulgar, por exemplo, que a TV pública (VTV, Venezolana de Televisión) dedicou 90% de seus espaços informativos para o governista PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela).
Até o Exército entrou na campanha do PSUV, usando sua rede capilar em todo o país.
Chávez ganha porque acuou a oposição, retirando poderes e funções de eleitos oposicionistas, e atacando a mídia? Sim, também.
Mas Chávez ganha, acima de tudo, porque seu "vínculo afetivo com um setor do país continua sendo muito poderoso", como admite Teodoro Petkoff, talvez o mais lúcido dos oposicionistas, um ex-guerrilheiro que transitou para a ortodoxia econômica e hoje é editor do jornal de oposição "Tal Cual".
Um só dado basta para explicar a solidez do "vínculo afetivo": a pobreza, nos anos Chávez, caiu de 49% para 26,4% da população, segundo o presidente do Instituto Nacional de Estatísticas, Elías Eljuri.
É verdade que a oposição contesta o número, mas não o fato de que a pobreza se reduziu.
Mais: os pobres têm a sensação de que deixaram de ser "invisíveis", ao contrário do que ocorria nos anos 90, período de decadência da democracia e da economia venezuelanas.
A questão chave da eleição de amanhã, portanto, é menos o número de assentos que a oposição conquistará (hoje, tem dez cadeiras, de ex-chavistas, porque cometeu a estupidez de não ter se apresentado no pleito de 2005).
Decisivo, mesmo, é saber se o modelo populista travestido de "socialismo do século 21" tem fôlego para continuar a conquistar o afeto da maioria.
As previsões não são nada favoráveis: afeto, como é óbvio no mundo inteiro, se conquista pelo bolso e o bolso dos venezuelanos estará entre 3% e 4% mais vazio este ano, de acordo com as previsões do economista Pedro Palma, ligado à Fedecámaras, a central empresarial.
Consequência de uma segunda queda consecutiva da economia, com o que a Venezuela "socialista" destoa totalmente do resto da América Latina "capitalista", que vai crescer 4%, na média.
O que não vai diminuir é a violência -que atinge mais os pobres, como no Brasil. No ano passado, um venezuelano foi assassinado a cada meia hora. A taxa de homicídios é de 75 por 100 mil habitantes, o dobro da Colômbia em guerra há meio século, três vezes mais que o assustado Brasil.
A eleição de amanhã acabará medindo o tamanho do afeto e da erosão que as dificuldades causam nele. Mas não reduzirão o ímpeto revolucionário de Chávez, que, no encerramento da campanha, já avisou ao país que está "esquentando os motores" para 2012, ano da eleição presidencial.


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