São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

REINO UNIDO

Falta de profissionais provoca recorde em espera por atendimento; associação de médicos propõe racionamento

Erros expõem crise em sistema de saúde britânico

JOSÉLIA AGUIAR
DE LONDRES

Um hospital do oeste de Londres acaba de anunciar o "recall" de 100 mil mamografias. Por causa de erro administrativo, uma paciente recebeu diagnóstico incorreto e só depois de algum tempo descobriu que possuía um tumor no seio.
O "recall" foi mais um dos desacertos do NHS, o serviço nacional de saúde britânico, que mereceu destaque na imprensa local nos últimos meses. Na lista estão incluídos até mesmo escândalos como o da retirada de órgãos de crianças sem autorização dos pais por um médico de Liverpool.
Sistema modelo no passado, o NHS começa a entrar em colapso por uma combinação de fatores que vão desde a falta de médicos e enfermeiros até o aumento da procura por parte da população. As filas para exames mais sofisticados deixam os pacientes aguardando meses pelo atendimento.
A população também está insatisfeita com o atendimento. O equivalente ao conselho federal de medicina britânico recebeu 4.470 reclamações em 2000, contra 3.000 em 1999. O governo do trabalhista Tony Blair admitiu recentemente que errou ao aumentar a expectativa dos britânicos quanto a uma possível melhora do serviço em curtíssimo prazo.
Antes de assumir, em 97, Blair prometeu reduzir as listas de espera nos hospitais, problema que já vinha sendo enfrentado pelos conservadores desde os anos 80.
Um ano depois, porém, ele viu o tempo de espera alcançar novo recorde. Da oposição, ainda partem críticas como a de que a atual administração gerencia mal a verba disponível para o setor.
Às vésperas de uma nova eleição, o premiê promete realizar a maior reforma do NHS desde sua criação, em 1948. Blair quer reunir mais 7.500 médicos, 20 mil novos enfermeiros e 6.500 empregados.
Pelas contas da Associação Britânica de Médicos, o NHS precisa aumentar em cerca de um terço a quantidade de médicos e enfermeiros -hoje, o total empregado já chega a 600 mil e representa 70% dos recursos gastos pelo governo na área da saúde.
A dificuldade em recrutar profissionais ocorre em grande parte pelo desinteresse dos jovens britânicos em ingressar numa profissão considerada de muita responsabilidade e cujos salários costumam ser pouco atrativos.
Há pouco tempo, associações de médicos, enfermeiros e pacientes se reuniram para divulgar uma proposta conjunta para melhorar o atendimento. A principal recomendação foi a de que haja racionamento. Ao invés de uma bateria com vários exames, médicos deveriam pedir apenas o estritamente necessário. Tratamentos menos urgentes deveriam ser encaminhados ao setor privado.
A Associação Britânica de Médicos recomendou que pacientes deveriam pagar mesmo que taxas pequenas para ajudar a custear o serviço. "Temos de aceitar que precisamos excluir alguns tratamentos do NHS se quisermos que o serviço continue universal", avalia o presidente da Associação Britânica de Médicos, Ian Bogle.
Para a entidade, é preciso que haja um debate nacional com o qual se discutirá qual serviço os britânicos querem e quanto estão dispostos a pagar por ele. "O NHS não pode fornecer todo o serviço que nós gostaríamos", concorda John Appleby, diretor de sistemas de saúde da associação independente The Kings Fund.



Texto Anterior: Multimídia:Campanha pacifista "distorce" causa
Próximo Texto: Hospital londrino faz "recall" de mamografias
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.