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TRAGÉDIA HISTÓRICA
Lobbies da Armênia e da Turquia atuam nos EUA para divulgar suas versões sobre genocídio armênio
Clinton homenageia vítimas armênias
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
de Washington
O presidente dos EUA, Bill Clinton, divulgou na quinta-feira declaração em que diz se juntar aos
armênios-americanos na lembrança de "um dos mais tristes
capítulos da história desse século,
a deportação e massacre de 1,5 milhão de armênios no Império Otomano nos anos de 1915 a 1923".
Com o início da Primeira Guerra
Mundial (1914-1918), ganhou força entre os armênios a idéia de independência. Muitos se alistaram
para combater junto com os inimigos do Império Otomano, especialmente a Rússia. Em 1915, os
turcos ordenam a deportação de
armênios para a Síria e Palestina.
No trajeto, centenas de milhares
foram mortos, num dos maiores
genocídios do século 20.
A manifestação de Clinton, mais
os fatos de que a Armênia é o segundo maior país beneficiário de
ajuda norte-americana per capita
(inferior apenas a Israel) e de que
50 parlamentares fazem parte do
grupo de pressão pró-Armênia no
Congresso dos EUA, pode dar a
impressão de que as duas nações
são aliadas automáticas e íntimas.
A verdade é mais intrincada. O
lobby armênio nos EUA é, de longe, o mais poderoso dentre os dos
países da região do mar Cáspio e
do Cáucaso. Mas o da Turquia não
é pequeno e há muitos interesses
mobilizados a favor do Azerbaijão, aliado turco, o que torna o
problema muito mais complexo.
A própria declaração de Clinton,
por exemplo, em vez de ser saudada pelos armênios como uma vitória, foi interpretada como insuficiente, pois não incluiu a palavra
"genocídio" para descrever os
acontecimentos de 1915.
Enquanto, em Washington,
Clinton divulgava sua declaração,
em Ierevan, capital da Armênia,
milhares de estudantes se concentravam diante da Embaixada dos
EUA para pedir o reconhecimento
oficial do país de que turcos praticaram genocídio contra armênios.
Clinton não vai atender a reivindicação, embora na campanha
presidencial de 1992 ele tenha chamado os incidentes de 1915 de
"genocídio". Na verdade, sua
tendência é caminhar na direção
contrária, pressionando o governo armênio para chegar a um entendimento com o Azerbaijão na
questão de Nagorno-Karabah.
Esse território, habitado por armênios (cristãos), foi entregue por
Moscou ao Azerbaijão (muçulmano) em 1923 e reconquistado por
forças armênias nos anos 90.
O lobby armênio é poderoso
porque representa uma comunidade étnica de cerca de 300 mil
pessoas, segundo o Censo dos
EUA. Fontes armênias falam em 1
milhão de armênios e descendentes. No grupo de congressistas que
apóia a Armênia, a maioria é do
Partido Democrata (de Clinton) e
há, entre eles, algumas estrelas,
como Patrick Kennedy, de Rhode
Island, filho do senador Edward
Kennedy, um cacique partidário.
Mas o "time adversário" não é
menosprezível. Há os aliados históricos da Turquia (como os republicanos George Shultz, ex-secretário de Estado, e Jesse Helms,
presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado) e os representantes de empresas exploradoras de petróleo (como o ex-secretário do Tesouro de Clinton,
Lloyd Bentsen, e o ex-assessor de
segurança nacional de Carter,
Zbigniew Brzezinski).
Querem não só que Clinton não
fale em genocídio armênio (veja
versão turca na cronologia abaixo)
como também que suspenda ou
atenue as sanções impostas ao
Azerbaijão em 92 por causa do
bloqueio do país contra a Armênia
devido a Nagorno-Karabah.
Nenhum desses grandes nomes é
formalmente lobista do Azerbaijão ou da Turquia. Mas eles jogam
pesado contra o lobby armênio,
argumentando que os EUA não
podem ter política de alinhamento
automático numa região conflagrada, que tem o segundo maior
depósito de petróleo do mundo.
E, embora o lobby turco não seja
tão poderoso quanto o armênio,
ele tem algum peso. Afinal, a Turquia faz parte da Otan (aliança militar liderada pelos EUA), é um
aliado histórico dos EUA e, apesar
da aproximação de Washington
com Teerã, ainda tem importância
estratégica no embate com o Irã.
Em janeiro, por exemplo, o embaixador da Turquia nos EUA,
Nuzhet Kandemir, participou de
debate na Universidade George
Washington, na capital americana. O principal assunto foram os
eventos de 1915. "Os números do
pretenso genocídio são produto
da imaginação", disse ele. "Por
que ninguém fala sobre os turcos
massacrados pelos armênios?"
Em março, cerca de 1.500 pessoas participaram em Washington
de um seminário sobre as relações
entre Turquia e EUA e pediram ao
governo Clinton maior atenção
para as necessidades turcas.
Afinal, o lobby turco pode não
ser tão grande e poderoso quanto
o armênio, mas foi suficiente para
criar um problema para a revista
"Time", no seu processo de escolha do "Homem do Século".
Embora não seja uma eleição direta, o mecanismo para definir o
"Homem do Século" inclui sugestões de leitores. E, graças a um
esforço da comunidade turca, o
vencedor disparado nas indicações é Mustafa Kemal Ataturk,
que estabeleceu a república na
Turquia, em 1923. Num só dia,
"Time" recebeu 170 mil cartas a
favor de Ataturk. Uma demonstração de força nada desprezível.
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