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São Paulo, segunda-feira, 26 de maio de 2003

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Brasil propõe criar frente comum

FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

O Brasil oficializou ontem o convite à Argentina para que formem uma frente comum de combate ao protecionismo de países ricos. Em "mensagem do governo brasileiro ao povo argentino", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pede ainda união na defesa do multilateralismo no mundo.
Implicitamente, o alvo das ações conjuntas dos vizinhos seria os EUA, que resistem a abrir seu mercado para produtos do Mercosul, sobretudo agrícolas, e que foi à guerra contra o Iraque sem autorização da ONU.
O texto de Lula, que participou ontem em Buenos Aires da posse de Néstor Kirchner na Presidência, não menciona abertamente os norte-americanos, no entanto.
"Brasil e Argentina vivem o melhor momento de suas relações. (...) Juntos, teremos melhores condições de combater as barreiras protecionistas dos países ricos, lutar nos foros internacionais para criar instrumentos capazes de enfrentar a fome e as desigualdades e defender o multilateralismo", diz.
O presidente afirma ainda que a ação conjunta dos dois países pode amplificar a integração regional. "Nossa responsabilidade vai além de nossas fronteiras. Temos um papel importante a desempenhar no fortalecimento do Mercosul, na integração da América do Sul e no diálogo com toda a América Latina e o Caribe."
A opção central pelo Mercosul fica clara na nota brasileira: "o Mercosul é o caminho necessário para o nosso desenvolvimento."
Lula faz na nota referência ao bom relacionamento que construiu com Eduardo Duhalde, antecessor de Kirchner -tão bom que o argentino pegou carona no avião presidencial brasileiro ontem à tarde, ao iniciar suas férias.
"Sem vaidades ou rivalidade, construímos com o presidente Eduardo Duhalde nestes últimos meses uma sólida parceria que só poderá progredir com a posse do amigo Néstor Kirchner", diz.
A vitória de Kirchner, político com ideologia próxima à centro-esquerda e que encarna a continuidade na Argentina, foi recebida com alívio pelo Planalto.
No curto prazo, o governo brasileiro aposta no apoio dele para a proposta de criação de um fundo internacional de combate à fome, que Lula levará à reunião do G-8 (grupo dos sete países mais industrializados do mundo, mais a Rússia), na semana que vem, em Evian (França).
No longo prazo, há a expectativa de ter no novo presidente um aliado na negociação com os EUA e com a União Européia de abertura de mercados.
"Queremos uma frente comum com a Argentina", disse o chanceler brasileiro, Celso Amorim. Segundo ele, as primeiras sinalizações de Kirchner são positivas, a começar pelo discurso de posse.
"Há muitos pontos de contato. Com Kirchner, chega à Presidência argentina um político que põe centralidade nas políticas sociais", disse o ministro.
Para Marco Aurélio Garcia, assessor especial de Lula, a frente Brasil-Argentina não existiria para confrontar cegamente o governo norte-americano, especialmente quanto à Área de Livre Comércio das Américas, mas para uma ação negociadora unida.
"Será um eixo do bem", disse, ao ser questionado por repórteres a respeito. A referência é ao "eixo do mal", que reuniria, na definição do presidente norte-americano, George Bush, nações que apóiam o terrorismo: Irã, Coréia do Norte e o Iraque pré-guerra.
De acordo com Garcia, a primeira ação conjunta de Brasil e Argentina deverá ser uma nova tentativa de revitalização do Mercosul. O assessor diz que será mais do que o "relançamento".
"Relançamento é uma expressão gasta. Mais do que relançamento, é aprofundamento e ampliação", disse. O Planalto crê que a boa aceitação popular de Lula em solo argentino ajudará na operação.
Ontem, o presidente brasileiro teve uma demonstração disso. Foi um dos mais aplaudidos ao entrar no Congresso argentino e demorou quase dez minutos para conseguir sentar-se em seu lugar, tamanha era a quantidade de pessoas que o cumprimentavam.

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