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Brasil propõe criar frente comum
FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES
O Brasil oficializou ontem o
convite à Argentina para que formem uma frente comum de combate ao protecionismo de países
ricos. Em "mensagem do governo
brasileiro ao povo argentino", o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva pede ainda união na defesa do
multilateralismo no mundo.
Implicitamente, o alvo das
ações conjuntas dos vizinhos seria os EUA, que resistem a abrir
seu mercado para produtos do
Mercosul, sobretudo agrícolas, e
que foi à guerra contra o Iraque
sem autorização da ONU.
O texto de Lula, que participou
ontem em Buenos Aires da posse
de Néstor Kirchner na Presidência, não menciona abertamente
os norte-americanos, no entanto.
"Brasil e Argentina vivem o melhor momento de suas relações.
(...) Juntos, teremos melhores
condições de combater as barreiras protecionistas dos países ricos, lutar nos foros internacionais
para criar instrumentos capazes
de enfrentar a fome e as desigualdades e defender o multilateralismo", diz.
O presidente afirma ainda que a
ação conjunta dos dois países pode amplificar a integração regional. "Nossa responsabilidade vai
além de nossas fronteiras. Temos
um papel importante a desempenhar no fortalecimento do Mercosul, na integração da América
do Sul e no diálogo com toda a
América Latina e o Caribe."
A opção central pelo Mercosul
fica clara na nota brasileira: "o
Mercosul é o caminho necessário
para o nosso desenvolvimento."
Lula faz na nota referência ao
bom relacionamento que construiu com Eduardo Duhalde, antecessor de Kirchner -tão bom
que o argentino pegou carona no
avião presidencial brasileiro ontem à tarde, ao iniciar suas férias.
"Sem vaidades ou rivalidade,
construímos com o presidente
Eduardo Duhalde nestes últimos
meses uma sólida parceria que só
poderá progredir com a posse do
amigo Néstor Kirchner", diz.
A vitória de Kirchner, político
com ideologia próxima à centro-esquerda e que encarna a continuidade na Argentina, foi recebida com alívio pelo Planalto.
No curto prazo, o governo brasileiro aposta no apoio dele para a
proposta de criação de um fundo
internacional de combate à fome,
que Lula levará à reunião do G-8
(grupo dos sete países mais industrializados do mundo, mais a
Rússia), na semana que vem, em
Evian (França).
No longo prazo, há a expectativa de ter no novo presidente um
aliado na negociação com os EUA
e com a União Européia de abertura de mercados.
"Queremos uma frente comum
com a Argentina", disse o chanceler brasileiro, Celso Amorim. Segundo ele, as primeiras sinalizações de Kirchner são positivas, a
começar pelo discurso de posse.
"Há muitos pontos de contato.
Com Kirchner, chega à Presidência argentina um político que põe
centralidade nas políticas sociais", disse o ministro.
Para Marco Aurélio Garcia, assessor especial de Lula, a frente
Brasil-Argentina não existiria para confrontar cegamente o governo norte-americano, especialmente quanto à Área de Livre Comércio das Américas, mas para
uma ação negociadora unida.
"Será um eixo do bem", disse,
ao ser questionado por repórteres
a respeito. A referência é ao "eixo
do mal", que reuniria, na definição do presidente norte-americano, George Bush, nações que
apóiam o terrorismo: Irã, Coréia
do Norte e o Iraque pré-guerra.
De acordo com Garcia, a primeira ação conjunta de Brasil e
Argentina deverá ser uma nova
tentativa de revitalização do Mercosul. O assessor diz que será
mais do que o "relançamento".
"Relançamento é uma expressão gasta. Mais do que relançamento, é aprofundamento e ampliação", disse. O Planalto crê que
a boa aceitação popular de Lula
em solo argentino ajudará na operação.
Ontem, o presidente brasileiro
teve uma demonstração disso. Foi
um dos mais aplaudidos ao entrar
no Congresso argentino e demorou quase dez minutos para conseguir sentar-se em seu lugar, tamanha era a quantidade de pessoas que o cumprimentavam.
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