São Paulo, sexta-feira, 26 de outubro de 2007

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entrevista

"Ancara já não pode retroceder"

DO ENVIADO A DIYARBAKIR

A bola está no campo dos americanos. A opinião é do analista político C. Cem Oguz, do jornal "Turkish Daily News". Para ele, o governo turco esgotou suas opções diplomáticas e agora cabe a Washington evitar uma ação militar de grande escala no Iraque contra o PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão). A análise de Oguz reflete uma revolta crescente de uma parcela conservadora e influente na Turquia contra os ataques do PKK, que vem pressionando o governo de Ancara a agir. Leia trechos de sua entrevista à Folha. (MN)

 

FOLHA - A diplomacia ainda pode funcionar?
C. CEM OGUZ
- Já não depende da Turquia, mas da liderança curda no Iraque, do governo central em Bagdá e, principalmente, dos EUA. A Turquia não tem mais como recuar. Essa crise está afetando a segurança do país, já custou as vidas de dezenas de soldados e, agora, a bola está do outro lado.

FOLHA - O que está por trás dessa crise?
OGUZ
- Imagine que um grupo terrorista fizesse ataques dentro do Brasil e depois se escondesse em um país vizinho, onde recebesse abrigo. O governo brasileiro certamente teria o direito de retaliar não só o grupo mas o país que lhe dá abrigo. O PKK quer arrastar a Turquia e os EUA para um confronto. Se os americanos permitirem, talvez consiga.

FOLHA - O que o sr. acha da afirmação feita por alguns políticos curdos de que a opressão do governo turco ao povo curdo dentro do país ajudou a reviver as ações do PKK?
OGUZ
- Há alguns dias, ao ser entrevistado por um dos principais canais da TV turca, um parlamentar curdo afirmou que os ataques terroristas recentes não foram cometidos pelo PKK, mas pelo próprio Exército. Se há opressão, como deixariam que ele fosse à TV dizer algo assim? No passado os curdos eram oprimidos, é verdade, mas isso mudou muito nos últimos anos e hoje há 24 deputados no Parlamento turco. Um dos motivos de o PKK ter intensificado suas ações é a perda de seu apoio popular.

FOLHA - Os interesses econômicos da Turquia no norte do Iraque poderão influir nos próximos passos de Ancara?
OGUZ
- Acho difícil, porque há sangue envolvido e a pressão popular está forçando o governo a tomar uma posição dura, tanto militar como política. Quando o assunto é segurança, todos os demais interesses vêm em segundo plano para o governo.

FOLHA - O PKK já vem fazendo ataques há pelo menos três anos. Por que a crise foi deflagrada neste momento?
OGUZ
- A Turquia pode ser acusada de muita coisa, mas não de não ter tentado evitar essa crise. Todas as promessas, do Iraque e dos EUA, ficaram no papel. E essa ópera bufa continua. O presidente iraquiano [Jalal Talabani], disse há alguns dias que "nem um gato curdo" será entregue à Turquia. Isso é diplomacia?

FOLHA - Como ficam as relações entre Turquia e EUA?
OGUZ
- Elas estão no pior momento de sua história. Uma pesquisa recente mostrou que 91% dos turcos são antiamericanos, uma deterioração drástica em relação à era da Guerra Fria, quando a grande maioria da população era simpática aos EUA.


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