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HISTÓRIA
Guerra urbana inutiliza tecnologia moderna
ALAN COWELL
DO "THE NEW YORK TIMES"
Cada edifício alto e arruinado se
torna um posto para tocaieiros,
cada via deserta uma zona de emboscada. Nessa espécie de guerra,
avanços e retiradas são medidos
em quarteirões, meios quarteirões ou mesmo em casas. Nos cálculos da batalha, o escudo da tecnologia dá lugar a falhas humanas
e a habilidades humanas: velocidade, camuflagem, conhecimento
estreito das ruas e becos.
Desde Stalingrado e Berlim na
Segunda Guerra Mundial, do ataque norte-americano a Hué, no
Vietnã, em 1968, e chegando às
zonas de combate de Beirute ou
Nablus, Belfast ou Mogadício, a
guerra urbana se tornou parte
central do arsenal dos mais fracos,
uma luta sem escrúpulos pela
vantagem posicional na guerra de
propaganda que explora as perdas de vidas civis e nega a superioridade bélica do intruso.
E é esse tipo confuso, manipulativo e mortífero de combate entre
forças convencionais e defensores
pouco visíveis que pode receber
os americanos em Bagdá.
"Os iraquianos vão querer lutar
de perto com tanques iraquianos
saindo de garagens e galpões e
voltando a se esconder neles", escreveu o general Wesley Clark, o
oficial americano hoje reformado
que comandou as forças da Otan
na campanha de Kosovo.
"A luta estará repleta de truques
que já vimos, e outros: emboscadas, rendições falsas, soldados
vestidos de mulher, ataques contra áreas de retaguarda e postos
de comando", afirma ele em artigo no "Times" de Londres.
Embora todos os comandantes
da coalizão anglo-americana tenham expressado indignação
quanto ao que encaram como táticas iraquianas pouco honrosas,
a guerra urbana sempre teve suas
regras de astúcia e disfarce, do uso
de um cavalo de madeira para pôr
fim ao cerco de Tróia, 3.100 anos
atrás, aos tempos modernos,
quando a guerra está na televisão
ao vivo, 24 horas por dia.
E, nesse mundo pós-Guerra
Fria, de guerra assimétrica, a luta
passou a ser por uma forma de
anular a tecnologia que permite
que as tropas americanas matem
sem sofrer baixas.
Nas décadas recentes, a guerra
urbana tomou muitas formas,
com muitos objetivos.
Quando as tropas soviéticas penetraram Berlim, em 1945, diante
dos frágeis remanescentes dos
exércitos do Terceiro Reich, sua
intenção era claramente a conquista, não a libertação que Washington diz procurar no Iraque.
Em Beirute, no anos 70, em contraste, as forças palestinas e das
demais organizações muçulmanas enfrentavam as milícias cristãs, divididas por uma linha religiosa cujos incongruentes marcos
eram hotéis de luxo à beira-mar,
perdidos e reconquistados em lutas de quarto a quarto.
As armas incluíam projéteis antitanque disparados do ombro,
fuzis de assalto, metralhadoras
montadas em picapes e sistemas
que punham em destaque a mobilidade e a capacidade de camuflagem. Mas, quando os fuzileiros
navais americanos intervieram
no Líbano, uma arma primária
-um caminhão-bomba- matou mais de 230 deles em 1983.
Em Berlim e Beirute e nos assaltos russos à capital tchetchena,
Grozni, os combates reduziram as
áreas urbanas a detritos. Mas é a
familiaridade do terreno urbano
que permite que seja usado com
vantagem por quem nele vive.
"A guerra urbana em geral beneficia o defensor" e "nega a vantagem tecnológica da coalizão",
diz Clifford Beal, editor da revista
"Jane's Defense Weekly".
Uma guerra que dependa da
baixa tecnologia e números elevados de combatentes e baixas é o
oposto daquilo que o moderno
Exército americano está treinado
para fazer. E mesmo o Exército
britânico não estaria totalmente
familiarizado com o terreno iraquiano ou o poder de fogo muito
maior de que as tropas iraquianas
poderão dispor em áreas urbanas.
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