São Paulo, domingo, 28 de maio de 2000


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INGLATERRA PARA OS INGLESES
Capital britânica registrou, em 99, mais de 63 denúncias de intolerância racial por dia
Casos de racismo disparam em Londres

RICARDO GRINBAUM
DE LONDRES

Quem anda pelas ruas do distrito de Newham, no extremo nordeste de Londres, vê uma cidade muito diferente das imagens de cartão-postal da praça Picadilly Circus ou do relógio Big Ben.
Em Newham, mais da metade da população é negra ou mestiça, a maioria das lojas tem letreiros escritos em hindi e muitas pessoas evitam sair de casa à noite, com medo da violência.
Newham é o local onde há o maior número de ataques por motivos raciais no Reino Unido. No ano passado, foram registradas mais de 1.300 denúncias na região, mil a mais do que em 1998.
"Aqui se concentram muitos trabalhadores desempregados e jovens sem perspectiva que acabam se transformando em "hooligans" (desordeiros) racistas", disse à Folha Barry Bracken, da Alert, instituição dedicada a combater o racismo. "A vida aqui não é fácil", afirmou Bracken.
Newham é um exemplo extremo de uma das questões que mais inquietam os britânicos no momento. Até poucos anos atrás, quando se falava em racismo na Europa pensava-se logo nos grupos de neonazistas alemães ou nos partidos de extrema direita da Áustria, da Itália ou da França.
Agora, há um medo de que esteja havendo um crescimento no número de "hooligans" racistas no Reino Unido.
Só em Londres, a polícia registrou 23.346 denúncias de agressão por motivos raciais no ano passado, mais de 63 por dia. É o dobro do número de casos registrados na cidade no ano anterior, além de superar o total de denúncias feitas em 1998 em todo o território do Reino Unido.
Os políticos e os acadêmicos pedem cautela, no entanto, no exame dos números. Para eles, o crescimento pode revelar um acirramento do ódio racial, mas também pode indicar que as pessoas estão se sentindo cada vez mais à vontade para fazer as denúncias.
O tratamento às denúncias de racismo mudou radicalmente nos últimos tempos, depois do chamado relatório McPherson, que revelou como a polícia fez vista grossa ao assassinato do adolescente negro Stephen Lawrence, morto por uma gangue de jovens brancos no sul de Londres. Depois disso, a polícia foi forçada a mudar seus métodos.
"O racismo é uma questão preocupante aqui, mas o Reino Unido é um dos países que reagem com maior rapidez ao problema", disse Gurbux Singh, presidente da Comissão por Igualdade Racial, principal organização a combater o racismo no país.

Radicalização política
No Reino Unido, ainda não existem movimentos racistas fortemente organizados como os neonazistas alemães. E o partido de extrema direita, o Nacional Britânico, é um nanico na política nacional.
O que mais preocupa, no entanto, é que pode estar havendo uma radicalização política em função do aumento da chegada de imigrantes de países pobres.
"Em algumas regiões, a violência é grande, especialmente quando existem muitos jovens brancos desempregados. Se eles vêem negros ou imigrantes asiáticos ou latinos subindo na vida, com carrões, eles partem para a violência", disse Mike Best, diretor do jornal "The Voice", que representa as minorias do Reino Unido.
Um caso emblemático do ódio racial no Reino Unido ocorreu em abril do ano passado, quando uma bomba com pregos explodiu no mercado de Brixton, no sul de Londres, muito frequentado por negros e por pessoas de origem asiática. A explosão deixou 40 pessoas feridas e matou um bebê de 1 ano e 11 meses.
Foram noticiados recentemente tantos casos de agressões racistas que houve quem tentasse tirar proveito da história. Em abril, Chris Cotter, namorado de uma das atletas mais importantes do Reino Unido, Ashia Hansen, recordista mundial do salto triplo, apresentou uma denúncia grave.
Cotter disse que foi esfaqueado por uma gangue porque ele é branco e estava namorando uma atleta negra. Na semana passada, a polícia descobriu que Cotter inventou toda a história para aproveitar a comoção no Reino Unido em torno do racismo e se promover. Acabou na cadeia.


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