São Paulo, domingo, 28 de maio de 2000


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VENEZUELA
Ex-apresentador de TV acusa governo de ameaçá-lo de morte e diz que presidente estimula o ódio aos meios de comunicação
Chávez persegue a imprensa, diz jornalista

LARISSA PURVINNI
ENVIADA ESPECIAL A CARACAS

O jornalista venezuelano Napoleón Bravo, 52, ex-apresentador do programa matinal "24 horas", transmitido pelo canal de TV Venevisión, afirma ser uma das vítimas da atitude agressiva do governo do presidente Hugo Chávez em relação à imprensa.
Bravo diz ter sido obrigado a abandonar o programa após receber ameaças de morte. Ao rastrearem as chamadas, diz, descobriu-se que vinham de telefones dos órgãos de segurança do Estado.
Dias depois, "24 horas", programa mais popular em seu horário (6h45-8h) era substituído por desenhos animados e a TV anunciava que ele havia sido promovido e trabalharia em um canal internacional da empresa. As acusações de ameaças e cerceamento da liberdade de imprensa são reiteradamente negadas pelo governo.
Com o fim do programa, diz Bravo, cessaram os telefonemas. "Conseguiram o que queriam", afirma. Leia trechos da entrevista à Folha.

Folha - Como é a relação do presidente Chávez com a imprensa?
Napoleón Bravo -
Os novos intolerantes descobriram que, além de um golpe de Estado, podem chegar ao poder por meio do justo ódio do povo diante do fracasso dos partidos em que acreditavam.
Enquanto têm popularidade, fazem a maior quantidade de votações possível para apoderar-se não apenas do Congresso, mas da Justiça, do Conselho Eleitoral, "muito democraticamente", para fazer ditaduras constitucionais. Quanto mais poder conseguem, mais intolerantes se tornam, porque se sentem mais fortes.
Na Venezuela, as três únicas frentes que enfrentam Chávez são a igreja, as Forças Armadas e os meios de comunicação.

Folha - De que maneira o presidente agride os meios de comunicação nos discursos?
Bravo -
Chama o principal canal de notícias, Globovisión, de "Plomovisión" (chumbovisão), refere-se a Gustavo Cisneros, proprietário de uma das principais redes de comunicação da América Latina, como oligarca. Diz que está manipulando a população. Pinta os jornalistas como inimigos do que ele chama "a revolução".

Folha - Por que o sr. recebeu ameaças?
Bravo -
O programa que eu dirigia nos últimos três anos estava em primeiro lugar em seu horário. Quando o dirigente é totalitário e está num processo eleitoral em que sua popularidade está baixando, não aceita a divergência.
Na Semana Santa, a imprensa mostra quais foram as figuras políticas mais queimadas como Judas, que foram Chávez e o candidato da oposição Francisco Arias. Como as únicas imagens que tínhamos eram de crianças queimando o presidente, decidimos não transmiti-las. Mas passamos uma pesquisa em que um dos entrevistados dizia que escolheria o presidente como Judas.
Depois, Chávez afirmou que havia sido queimado na TV como Judas. Afirmamos que não havíamos mostrado essas imagens, mas que agora as mostraríamos.
Em outro episódio, convidamos os três candidatos à Presidência para entrevistas. Quando Arias viu o anúncio do convite a Chávez, afirmou que o presidente não viria por ser covarde.
Em um pronunciamento no Estado de Vargas o presidente atacou o proprietário do canal. "Estão afirmando que irei a esse canal, mas nem sequer me convidaram. Não permitam que se manipule o povo. Senhor Cisneros, não tenho medo nem de todos os entrevistadores juntos. Não me importam as mentiras dos oligarcas. Chumbo também para vocês."

Folha - Que tipo de ameaça houve após esses episódios?
Bravo -
Tanto minha família quanto outra, também relacionada ao canal, receberam chamadas com ameaças de morte. Uma companhia de segurança gravou e rastreou as chamadas telefônicas e descobriu que todas as chamadas vinham de dois telefones do corpo de segurança do Estado. Os grupos armados que integram o partido de Chávez agridem os jornalistas. Batem nos profissionais, tentam tirar-lhes as câmeras ou os chamam de vendidos.

Folha - Chávez chegou a ser entrevistado em seu programa?
Bravo -
Muitas vezes. Sua mulher também participou. Chegamos a fazer reportagens de duas horas sobre coisas positivas que fez o governo. Por exemplo, nos primeiros meses, o Exército renovou hospitais e escolas. O governo promoveu a redação de uma nova Constituição, que, com seus altos e baixos, é melhor que a anterior. Isso uma pessoa imparcial, ainda que magoada como eu, tem de reconhecer.


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