São Paulo, sábado, 28 de junho de 2008

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Governo do Zimbábue coage eleitores, dizem testemunhas

Milícias vigiam urnas e obrigam zimbabuanos a entregar número de cédulas

Ex-candidato opositor recua e diz que poderá negociar com Mugabe mesmo após pleito; próximos dias serão teste para poder de ditador

Emmanuel Chitate/Reuters
Em Bulawayo, mulher mostra a tinta no dedo que confirma votação; eleitores de todo o país foram coagidos a participar ontem

DA REDAÇÃO

Com baixo comparecimento e relatos de coerção, zimbabuanos votaram ontem no segundo turno de uma eleição presidencial na qual espera-se que o único candidato, o ditador Robert Mugabe, declare vitória nos próximos dias.
A votação, organizada apesar de críticas quase universais, foi considerada uma farsa pelos EUA e pela União Européia, que já declararam que não aceitarão o resultado.
O ex-candidato opositor Morgan Tsvangirai, do Movimento pela Mudança Democrática (MDC), saiu brevemente de seu refúgio na Embaixada da Holanda em Harare (capital) ontem para denunciar o "exercício de intimidação em massa, com pessoas em todo o país sendo obrigadas a votar".
Tsvangirai venceu Mugabe no primeiro turno, em 29 de março, por 47,9% a 43,2%. Apesar de ter o nome na cédula, ele retirou sua candidatura no último domingo devido à violenta repressão contra seu partido, que matou quase 90 pessoas e expulsou 200 mil de suas casas.
Refugiado há uma semana, ele baixou o tom e disse ontem que poderá negociar com o governo após o pleito, contrariando declarações anteriores.
Mugabe, indiferente à condenação externa, votou com sua mulher nos arredores de Harare, e disse que estava "muito otimista e muito animado" com a eleição. Analistas estimam que o ditador de 84 anos -28 deles no poder- busque uma ampla vitória para melhorar sua posição em negociações futuras com o MDC.

Intimidação
O clima entre a população era diferente. "A maioria de nós só está votando para que nos deixem em paz", disse o zimbabuano Joseph Kundiona ao site de notícias locais "ZimOnline".
Na cidade de Chitungwiza, ao sul da capital, testemunhas afirmam que eleitores foram obrigados a entregar o número de série de suas cédulas, assim como documentos de identidade, a membros do partido governista, Zanu-PF, para que seu voto pudesse ser conferido.
Em alguns subúrbios de Harare, residentes disseram ao "New York Times" que foram reunidos na véspera da eleição, forçados a cantar hinos pró-Mugabe e depois levados às seções eleitorais. Ali foram obrigados a copiar os números de série das cédulas. "Votei em Mugabe por que não queria arriscar a vida", disse um eleitor que pediu anonimato.
Em áreas rurais, moradores foram forçados a se declarar analfabetos para permitir a entrada na cabine de votação de "assistentes" leais a Mugabe.
Relatos dão conta de que o comparecimento no campo foi maior do que em zonas urbanas, mas mesmo assim muito inferior ao do primeiro turno.
Diferentemente da votação de março, quando o resultado demorou mais de um mês para ser divulgado, espera-se que o resultado do segundo turno saia rapidamente, para permitir que Mugabe vá já reeleito à cúpula da União Africana (UA) na próxima semana no Egito.
Os próximos dias serão um teste para ver se o ditador consolidará o poder -sobretudo entre líderes africanos, considerados os únicos capazes de influenciar o país. Sinais iniciais de antagonismo foram rechaçados pelo ditador: "Quero ver que líder africano levantará o dedo contra o Zimbábue (...), pois as eleições foram livres".
É também aguardada com ansiedade a reação da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, que criticou a realização do segundo turno.
O Conselho de Segurança da ONU expressou ontem consternação com a realização do segundo turno, que segundo o órgão ocorreu sem condições para um voto livre e justo. Uma declaração mais forte foi barrada pela África do Sul.


Com agências internacionais


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