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VIOLÊNCIA URBANA
Atual prefeito da capital colombiana estuda fechar bares e clubes mais cedo; hoje, lei obriga fechamento à 1h
Prefeitura defende fechar Bogotá às 23h
OTÁVIO DIAS
enviado especial a Bogotá
Ainda não é meia-noite e as ruas
da Zona Rosa, o bairro noturno de
Bogotá, estão cheias de gente. Luminosos coloridos com motivos
tropicais chamam para uma noite
de salsa. O ritmo caribenho se
mescla à batida tecno que vaza,
junto com rolos de fumaça, pelas
portas entreabertas dos clubes.
Tudo parece caminhar para uma
animada noite de sábado, mas
pouco antes da 1h as casas noturnas desligam os equipamentos, os
bares param de servir bebidas, e a
diversão é interrompida.
Desde 1995, todos os estabelecimentos noturnos da capital colombiana são obrigados a fechar à
1h, em cumprimento a uma lei
apresentada pelo então prefeito
Antanas Mockus (95-97), com o
objetivo de reduzir rapidamente o
alto índice de homicídios na cidade: 74 por cada 100 mil habitantes.
O atual prefeito, Enrique Peñalosa, estuda tornar a medida ainda
mais rígida a partir de julho, quando o fim da noite poderia ser
adiantado para as 23h. A proposta
reacendeu a polêmica em Bogotá.
"É uma lei autoritária e moralista, um toque de recolher simulado", diz a ilustradora Olga Cuellar, 39. "A violência se reduz com
segurança e medidas educativas."
Segundo ela, a lei resultou na
abertura de diversos bares clandestinos e muitas pessoas têm viajado para municípios vizinhos para curtir a noite até mais tarde.
Para o cientista político Alfredo
Rangel, 44, pesquisador na área de
violência da Universidade de Los
Andes, a decisão se justifica devido à relação estreita entre o consumo de álcool e o índice de homicídios não-premeditados.
Segundo ele, essa relação se explica por um fator cultural -os
colombianos teriam uma agressividade latente- e pelo grande número de armas em circulação.
"É sem dúvida uma restrição de
liberdade. Imagine o Carnaval do
Rio terminando às 23h. Mas havíamos chegado ao limite."
Segundo o Instituto de Medicina
Legal de Bogotá, houve 3.885 homicídios na cidade em 94 (antes da
lei). Em 97, foram 2.900.
Os estudantes de engenharia Oscar Ospina, 18, e Andrés Ramirez,
17, concordam com o limite da 1h.
"Nesta cidade, não há outro jeito", diz Ospina. "Acho que somos violentos por causa de toda a
violência a que estamos acostumados neste país", afirma Ramirez.
Preservação da vida
O próprio ex-prefeito Antanas
Mockus, 47, acha que a medida
não é a solução ideal. "Mas a preservação da vida foi a prioridade
de meu governo", disse à Folha.
Mockus, professor universitário
de matemática, se elegeu prefeito
após uma gestão polêmica como
reitor da Universidade Nacional
(pública), durante a qual iniciou a
cobrança de mensalidade proporcional ao nível sócio-econômico
do aluno e estabeleceu métodos de
avaliação tanto dos estudantes
quanto dos professores.
Ao propor a lei, Mockus se baseou em pesquisas que relacionavam o nível de álcool no sangue
com as taxas de homicídios.
"Exames de sangue feitos em 95
mostraram que 33% dos homicídios com armas de fogo ocorridos
na capital coincidiam com o consumo elevado de álcool", diz.
De acordo com os mesmos estudos, a maior parte dos crimes de
Bogotá aconteciam durante os finais de semana, entre 1h e 6h.
"Em 97, após a aprovação da lei,
o índice de homicídios caiu para
51 crimes por 100 mil habitantes.
Foi uma conquista, mas ainda é o
dobro da média na América Latina, onde ocorrem 22 homicídios
por 100 mil em média", afirma.
"O colombiano é pouco sensível
ao que a violência significa. Quando nos tornarmos menos violentos, voltaremos a sair à noite."
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