São Paulo, terça-feira, 29 de junho de 2004

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Violência afeta óleo e assusta investidores

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O premiê interino do Iraque, Iyad Allawi, prometeu ontem "estudar um projeto de privatização", mas não deu detalhes. Mencionou o assunto em meio a um apelo para que a comunidade internacional participasse da reconstrução de seu país.
Dilip Hiro, especialista em Iraque radicado em Londres, disse à Folha que privatizações estavam nos planos de Paul Bremer, chefe da Autoridade Provisória da Coalizão, que encerrou ontem sua missão em Bagdá, e do vice-presidente americano, Dick Cheney.
Segundo o analista, os EUA precisaram recuar para não violar as Convenções de Genebra, que definem os limites de atuação de forças estrangeiras de ocupação.
Bremer e Cheney pretendiam privatizar 200 empresas, sem limites para a participação estrangeira no capital, diz Hiro. Mas, ao lado de obstáculos jurídicos, a violência interna desestimulou potenciais interessados.
O Estado controla o petróleo, o gás, a eletricidade, as telecomunicações e os transportes. Monopólios estatais estavam na lógica de centralização do regime deposto.
Valérie Marcel, pesquisadora do Royal Institute of Internacional Affairs, em Londres, disse à Folha que não se pensou em privatizar a estatal de petróleo. O plano estudado pelos EUA estava na adoção de contratos de risco.
Mas o roteiro só seria desencadeado depois de uma lei sobre riquezas naturais, que poderá ser elaborada pela Assembléia a ser eleita em janeiro próximo.
Outro especialista, Gerald Butt, editor da "Middle East Economic Survey", disse à Folha que, sem segurança interna, os contratos de risco não serão atraentes.
Os atos de sabotagem interrompem com freqüência o fornecimento de eletricidade. Segundo Butt, os contratos de risco também deverão superar as resistências da tecnocracia iraquiana, anterior à ditadura de Saddam, que controla o setor do óleo.
O premiê Allawi disse há dias que as sabotagens em refinarias e oleodutos já deram ao país US$ 1 bilhão em prejuízos.
Segundo dados veiculados no site da Opep, cartel mundial do petróleo, seriam necessários US$ 20 bilhões para que o Iraque atinja o patamar de produção do final dos anos 70 (3,7 milhões de barris diários). O país hoje produz 2,5 milhões. Só 1.600 dos 2.300 poços estão ativos. O Iraque tem a terceira maior reserva mundial comprovada, atrás da Arábia Saudita e do Canadá.

Medida "acadêmica"
Butt disse que a reativação de um Banco Central foi um passo na boa direção, mas será uma medida "meramente acadêmica" se o sistema financeiro não tiver condições para funcionar.
"O problema é saber se o sistema é robusto o bastante para resistir à falta de eletricidade, aos seqüestros e aos atentados", disse.
A seu ver, o país tampouco possui instrumentos estatísticos confiáveis. Não se sabe, por exemplo, qual a inflação. A impressão é apenas que ela desacelerou, porque o dinheiro dura mais tempo no bolso dos consumidores.
O quadro de insegurança desencoraja investidores externos e iraquianos interessados em abrir negócios de pequeno porte, afirma o especialista.
Há por fim a dívida externa, de US$ 120 bilhões. O FMI, diz Valérie Marcel, propôs que os credores cancelassem até 95% do que deveriam teoricamente receber. A dívida é um dos gargalos para a reconstrução do país.


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