São Paulo, segunda-feira, 29 de julho de 2002

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Movimentos são muito distintos, diz analista

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

A aversão à imigração e o sentimento de viver num "continente invadido" são os principais aspectos que unem todos os movimentos de extrema direita europeus.
A análise é de Jean Leca, politólogo do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po) e especialista na questão. Para ele, os movimentos de extrema direita ainda são muito distintos para defender uma plataforma comum.
Leia a seguir trechos da entrevista que ele concedeu à Folha na última semana, em São Paulo.

Folha - O que são os movimentos de extrema direita na Europa hoje?
Jean Leca -
Trata-se de diversos grupos, não de movimentos coerentes e unidos. É verdade que há aspectos que os unem, mas não podemos esquecer que também há enormes diferenças entre eles.
Por exemplo, o único ponto que unia o líder da extrema direita holandesa assassinado em maio, Pim Fortuyn, à Frente Nacional francesa era a idéia de impedir a entrada de imigrantes na Europa.
Fortuyn era homossexual e defendia os direitos das mulheres. Muitos elementos de sua ideologia não eram característicos de uma ideologia fascista tradicional. Ele não era machista nem antifeminista. Sua idéia-chave era a de que os holandeses deveriam "retomar o controle do país". Assim, era contrário à imigração e desconfiava das intenções dos dirigentes da União Européia.
Essa idéia e o sentimento de viver num "continente invadido" são os principais aspectos que unem os movimentos de extrema direita europeus. Invadido por estrangeiros que, para eles, tiraram as coisas da ordem e provocaram um sentimento de insegurança. Eles querem, portanto, restabelecer a ordem e a segurança por meio de medidas xenófobas.

Folha - Como esse nacionalismo radical influencia a sociedade?
Leca -
Trata-se, em sua maioria, de países que tiveram colônias, mas que hoje não são mais grandes potências mundiais. Assim, o nacionalismo não é mais um elemento de política externa, porém continua sendo um fator social importante. Nenhum governo europeu admite ser nacionalista, contudo, internamente, os políticos não cansam de lembrar a importância dos valores nacionais.
O nacionalismo social básico está presente da Espanha à Áustria, da Dinamarca à Itália, inclusive provocando disputas entre países europeus, como ilustram os protestos dos caminhoneiros franceses contra seus colegas espanhóis.
Como esse nacionalismo bruto, quase instintivo, não costumava fazer parte da plataforma dos partidos de direita, a porta ficou aberta para a extrema direita.

Folha - A direita tenta usar parte desse discurso para ganhar votos?
Leca -
A principal característica da extrema direita européia é a de ligar dois temas: atitude repressiva no que se refere à insegurança e aversão aos estrangeiros. Para os extremistas, os imigrantes são responsáveis pela insegurança. Com isso, para eles, é necessário pôr fim à imigração.
Por outro lado, a estratégia da direita tradicional nessa área, que, às vezes, também é a da esquerda, consiste em separar os dois temas: a insegurança e a imigração.
Assim, a direita fala em repressão aos infratores, já que se trata de um tema importante para seus eleitores. Todavia somente a extrema direita vê ligação direta entre uma atitude repressora que visa a restaurar o sentimento de segurança da população e a exclusão dos estrangeiros. Trata-se de um tema delicado, pois os políticos tradicionais sabem que, muitas vezes, a imigração é indispensável por razões demográficas.


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