São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA / CIRCO POLÍTICO

Democrata enfrenta o paradoxo do sucesso

Partido diz que após render o que podia fator celebridade tem de ser contido

Obama deve passar a temas rotineiros; cenário pomposo de discurso dá munição aos republicanos que o acusam de prepotência e elitismo


ENVIADO ESPECIAL A DENVER

No final da tarde de ontem, enquanto a equipe técnica de Barack Obama colocava em pé o discurso-espetáculo que ele depois fez à noite no estádio Invesco, em Denver, no Colorado, um aviãozinho contratado pelo time do republicano John McCain circulava os céus da cidade. Levava uma faixa em que se lia: "Obama para rockstar; McCain para presidente".
Mesmo que passasse pelas imediações do estádio, era improvável que os primeiros a chegar à arquibancada percebessem a provocação. Seus olhos estavam grudados no palco cujo cenário eram colunas gregas, que emolduravam dois telões, como se fosse uma versão gigante da sala de estar dos Sopranos, da série homônima.
Ali, ensaiava o Hino Nacional americano a cantora e atriz Jennifer Hudson, revelada ao público durante o programa de auditório "American Idol". A programação da noite incluiu ainda apresentações de Stevie Wonder e de Jon Bon Jovi. Na platéia, eram vistas estrelas como a cantora-atriz Jennifer Lopez, a apresentadora Oprah Winfrey e o diretor Spike Lee.
Celebridade mundial de fato, capaz de atrair o maior contingente de pessoas para um discurso de aceitação da candidatura de um partido desde que John F. Kennedy lotou um estádio em Los Angeles, em 1960, Obama sofre o paradoxo do sucesso. Ao mesmo tempo em que não pode virar as costas para a base fiel de eleitores que o trouxe até aqui, corre o risco de alienar o eleitor operário, de baixa renda e menos instruído, que resiste em apoiá-lo.
De quebra, fornece combustível para mais ataques de McCain, que baseou sua campanha em dois pilares: a inexperiência administrativa e pouca idade do concorrente de 47 anos e o que chama de elitismo.
"E nada diz mais "elitismo" do que colunas gregas", lamentou o blog progressista "Huffington Post". Obama e McCain estão tecnicamente empatados na média das pesquisas, com 47,2% e 44,3% respectivamente, segundo o site agregador Real Clear Politics.

Semideus
A campanha do republicano não perdeu tempo: "Trabalhadores concluem uma das maravilhas do mundo político moderno, o Templo de Obama, ou a Barackpolis", escreveu em e-mail Brian Rogers, assessor do republicano. Os ataques haviam começado no dia anterior, quando as primeiras fotos vazaram à imprensa. "Amanhã [ontem], vocês vão ver Obama descer do Olimpo para ficar um pouco entre nós, mortais", brincou Michael Steel, ex-vice governador de Maryland.
Depois, falando sério, disse que o país precisa de um presidente "que seja um pouco mais do que uma marca". Pois a marca Obama tal como vem sendo vendida tem dias contados. David Plouffe, assessor de Obama, rebateu que o cenário é parecidíssimo àquele onde Bush aceitou sua nomeação 2004.
Mas, internamente, a avaliação do Partido Democrata é que o fator celebridade já angariou todos os votos que poderia angariar. Dessa maneira, o evento de ontem foi, dizem, o último do tipo até as eleições de novembro. Doravante, o que se verá é um Obama lidando com o que os analistas políticos chamam de "questões da mesa da cozinha", preocupações da classe média norte-americana como o preço da gasolina e a crise financeira e de habitação.
Não por acaso, o comando da campanha anunciou que a partir de hoje Obama e seu companheiro de chapa, Joe Biden, farão um tour de ônibus por três Estados sem preferência partidária clara onde o democrata está tecnicamente empatado com o rival. São os industriais Michigan e Pensilvânia, que votaram no partido em 2004, e Ohio, que votou nos republicanos, os três de forte presença de operários, que se ressentem do fechamento de vagas de trabalho nos últimos anos.
Com os dois vão as mulheres, Michelle e Jill, reforçando o tom populista. É a primeira vez que Obama faz um evento do tipo. Até então, vinha cruzando o país em seu avião de campanha. Ele repete assim o que fizeram Bush e Dick Cheney após a Convenção Republicana de 2000, de trem, e os democratas Bill Clinton e Al Gore, de ônibus, em 1992.
(SÉRGIO DÁVILA)



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