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SUCESSÃO NOS EUA / CIRCO POLÍTICO
Democrata enfrenta o paradoxo do sucesso
Partido diz que após render o que podia fator celebridade tem de ser contido
Obama deve passar a temas rotineiros; cenário pomposo de discurso dá munição aos republicanos que o acusam de prepotência e elitismo
ENVIADO ESPECIAL A DENVER
No final da tarde de ontem,
enquanto a equipe técnica de
Barack Obama colocava em pé
o discurso-espetáculo que ele
depois fez à noite no estádio Invesco, em Denver, no Colorado,
um aviãozinho contratado pelo
time do republicano John
McCain circulava os céus da cidade. Levava uma faixa em que
se lia: "Obama para rockstar;
McCain para presidente".
Mesmo que passasse pelas
imediações do estádio, era improvável que os primeiros a
chegar à arquibancada percebessem a provocação. Seus
olhos estavam grudados no palco cujo cenário eram colunas
gregas, que emolduravam dois
telões, como se fosse uma versão gigante da sala de estar dos
Sopranos, da série homônima.
Ali, ensaiava o Hino Nacional
americano a cantora e atriz
Jennifer Hudson, revelada ao
público durante o programa de
auditório "American Idol". A
programação da noite incluiu
ainda apresentações de Stevie
Wonder e de Jon Bon Jovi. Na
platéia, eram vistas estrelas como a cantora-atriz Jennifer Lopez, a apresentadora Oprah
Winfrey e o diretor Spike Lee.
Celebridade mundial de fato,
capaz de atrair o maior contingente de pessoas para um discurso de aceitação da candidatura de um partido desde que
John F. Kennedy lotou um estádio em Los Angeles, em 1960,
Obama sofre o paradoxo do sucesso. Ao mesmo tempo em
que não pode virar as costas para a base fiel de eleitores que o
trouxe até aqui, corre o risco de
alienar o eleitor operário, de
baixa renda e menos instruído,
que resiste em apoiá-lo.
De quebra, fornece combustível para mais ataques de
McCain, que baseou sua campanha em dois pilares: a inexperiência administrativa e pouca idade do concorrente de 47
anos e o que chama de elitismo.
"E nada diz mais "elitismo" do
que colunas gregas", lamentou
o blog progressista "Huffington
Post". Obama e McCain estão
tecnicamente empatados na
média das pesquisas, com
47,2% e 44,3% respectivamente, segundo o site agregador
Real Clear Politics.
Semideus
A campanha do republicano
não perdeu tempo: "Trabalhadores concluem uma das maravilhas do mundo político moderno, o Templo de Obama, ou
a Barackpolis", escreveu em e-mail Brian Rogers, assessor do
republicano. Os ataques haviam começado no dia anterior,
quando as primeiras fotos vazaram à imprensa. "Amanhã
[ontem], vocês vão ver Obama
descer do Olimpo para ficar um
pouco entre nós, mortais",
brincou Michael Steel, ex-vice
governador de Maryland.
Depois, falando sério, disse
que o país precisa de um presidente "que seja um pouco mais
do que uma marca". Pois a marca Obama tal como vem sendo
vendida tem dias contados. David Plouffe, assessor de Obama,
rebateu que o cenário é parecidíssimo àquele onde Bush aceitou sua nomeação 2004.
Mas, internamente, a avaliação do Partido Democrata é
que o fator celebridade já angariou todos os votos que poderia
angariar. Dessa maneira, o
evento de ontem foi, dizem, o
último do tipo até as eleições de
novembro. Doravante, o que se
verá é um Obama lidando com
o que os analistas políticos chamam de "questões da mesa da
cozinha", preocupações da
classe média norte-americana
como o preço da gasolina e a
crise financeira e de habitação.
Não por acaso, o comando da
campanha anunciou que a partir de hoje Obama e seu companheiro de chapa, Joe Biden, farão um tour de ônibus por três
Estados sem preferência partidária clara onde o democrata
está tecnicamente empatado
com o rival. São os industriais
Michigan e Pensilvânia, que votaram no partido em 2004, e
Ohio, que votou nos republicanos, os três de forte presença de
operários, que se ressentem do
fechamento de vagas de trabalho nos últimos anos.
Com os dois vão as mulheres,
Michelle e Jill, reforçando o
tom populista. É a primeira vez
que Obama faz um evento do tipo. Até então, vinha cruzando o
país em seu avião de campanha.
Ele repete assim o que fizeram
Bush e Dick Cheney após a
Convenção Republicana de
2000, de trem, e os democratas
Bill Clinton e Al Gore, de ônibus, em 1992.
(SÉRGIO DÁVILA)
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