São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 2000

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Aliados de Milosevic "abandonam navio afundando"

PAULO DANIEL FARAH
DA REDAÇÃO

Aliados de Slobodan Milosevic estão agindo "como ratos que abandonam um navio afundando", o que pressiona o presidente iugoslavo a deixar o poder.
"Até aliados militares e policiais estão aparentemente mudando de postura", disse à Folha o cientista político norte-americano Michael Gary Roskin, autor de "The Third Balkan War, and How It Will End" (a terceira guerra balcânica, e como ela acabará).
A seguir, trechos da entrevista concedida por telefone dos EUA.

Folha - Diversos líderes europeus e o presidente Bill Clinton acusaram o governo iugoslavo de interferir nas eleições e promover fraudes. Além dos ataques verbais, que medidas concretas adotaram?
Michael Gary Roskin -
A União Européia e os EUA devem manter as sanções contra a Iugoslávia se Milosevic não sair do governo. A economia iugoslava está em péssimas condições, o que não permite ao país o luxo de ignorar o embargo. Apenas se Milosevic deixar o poder, vão parar de tratar a Iugoslávia como um país pária e pôr fim às sanções.

Folha - Eles não consideram a possibilidade de uma ação militar?
Roskin -
Creio que só vai haver uma intervenção militar se Milosevic se recusar a deixar o governo e houver violência civil no país, o que poderia incluir a saída de Montenegro (República que, junto com a Sérvia, forma a Iugoslávia) do país. Se ele tentar impedir isso (a independência de Montenegro), pode haver uma resposta militar. Creio que uma intervenção militar é improvável, mas pode ocorrer caso haja atos de violência civil.

Folha - Vai haver segundo turno?
Roskin -
Duvido. Kostunica deixou claro que, se aceitar um segundo turno, vai aceitar uma fraude no primeiro turno. O caso é semelhante ao que houve no Peru, com Alejandro Toledo se recusando a continuar no jogo.

Folha - Nos últimos dias a oposição promoveu grandes protestos e convocou uma greve geral. Isso pode provocar instabilidade no país?
Roskin -
Alguns dos simpatizantes de Milosevic estão agindo como ratos que abandonam um navio afundando. Mesmo aliados militares e policiais estão aparentemente mudando de postura. Justamente por isso, estou otimista e creio que ele sairá do governo.
A Europa e os EUA estão apoiando a oposição. Esperam que a reivindicação de Kostunica seja tão forte e tão óbvia que leve Milosevic a desistir. Nesse caso, ele provavelmente vai deixar a Iugoslávia e ir para a Rússia. Ele ainda tem medo de ser extraditado para Haia (na Holanda), para ser julgado por crimes de guerra.

Folha - Kostunica disse que não o enviaria para Haia...
Roskin -
Sim, ele disse que não prejudicaria Milosevic, que não o extraditaria. Mas a Europa e os EUA depositam grande esperança em Kostunica. Ele é muito mais democrático e moderno que Milosevic, mas ainda é um nacionalista sérvio.
Não vai desistir de um centímetro quadrado de Kosovo. De um certo modo, é mais fácil lidar com Milosevic, basta se opor a ele.
Como claramente apoiaram Kostunica, incluindo dinheiro da CIA (agência de inteligência dos EUA), estaríamos numa posição engraçada ao ajudar a levar ao poder um homem inteligente, moderno e democrático, mas que continua a ser um nacionalista que vai lutar pelos interesses sérvios e por seu território.
A atmosfera vai mudar, numa direção muito boa, mas as diretrizes serão as mesmas.

Folha - E Montenegro?
Roskin -
Kostunica seria muito mais aberto ao separatismo montenegrino, mas a situação deve se acalmar nessa República iugoslava se ele assumir a Presidência.


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