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Economia timorense depende dos estrangeiros de passagem
DO ENVIADO ESPECIAL
O hotel mais conhecido de Dili é
o Olympia: está ancorado bem na
frente do enorme edifício do governo ocupado pela Untaet (sigla,
em inglês, para Administração
Transitória das Nações Unidas
em Timor Leste). Nele se hospedam uma babel de funcionários
da ONU, militares da força de paz
e estrangeiros em geral. É constituído de duas chatas ligadas à terra por longas passarelas metálicas. Ao redor do ingresso da passarela, vigiado por seguranças, se
reúne uma pequena favela de barracos que vendem churrasquinho, bananas e outros nadas.
Também é logo ali que, aproveitando a sombra de duas árvores
frondosas, muitos timorenses parecem gostar de passar o tempo.
As crianças escolhem o mesmo
lugar para brincar na água. O dia
inteiro há meninos pendurados
nas passarelas e nadando ao redor
do Olympia, talvez um dos trechos mais sujos da praia por causa do lixo das embarcações.
A concentração de homens,
crianças e barracos parece uma
inquietante metáfora da dependência que ameaça se instaurar.
Como se o povo se dispusesse a
organizar sua vida ao redor dos
restos e do lixo da transitória presença dos hóspedes do Olympia.
As crianças de Dili se dirigem a
qualquer estrangeiro com a mesma frase: "Hello, mister". Querem
arrancar um sorriso e, às vezes,
um dinheirinho. Acaba de ser
inaugurado o primeiro supermercado moderno da capital, voltado para a clientela estrangeira.
Foi chamado de "Hello, Mister!".
Na mesma linha, a Untaet é
também o empregador preferido
pelos timorenses. Não só pelo salário: a ONU paga a seus funcionários timorenses valores elevados, mas compatíveis com o mercado local de trabalho. Paradoxalmente, a Untaet, cuja existência é
transitória, aparece como um emprego seguro. O gosto pela dependência, instilado pela ocupação
Indonésia, é excitado pela presença assistencial da ONU.
O engenheiro João Carrascalão,
55, ministro da Infra-Estrutura,
considera que o país seja auto-suficiente na subsistência básica. O
cultivo de arroz, frutas e legumes
responde ao consumo interno, assim como o rebanho bovino e caprino. Existe também uma pequena produção de café de alta
qualidade que poderá ser exportada. E há o petróleo no mar, na
falha de Timor. O governo provisório está renegociando sua exploração com a vizinha Austrália.
Carrascalão diz que o Orçamento atual de Timor é de US$ 49,3
milhões. Destes, US$ 17 milhões
vêm da renda fiscal do próprio
país. O resto é extraído do orçamento da Untaet. Segundo Carrascalão, não é improvável que,
num futuro próximo, Timor consiga engendrar uma receita igual a
seu Orçamento ou quase.
O orçamento da Untaet é de
US$ 800 milhões: 16 vezes o Orçamento timorense. Produz-se artificialmente uma enorme injeção
de consumo em Timor. São milhares de funcionários da ONU e
de centenas de ONGs, técnicos e
administradores, jornalistas e militares, que passam por Timor, especialmente por Dili.
Os sinais de retomada econômica são efeito dos serviços oferecidos a essa massa que gravita ao redor da reconstrução: mais ou menos 15 mil pessoas, 1 para cada 40
timorenses, uma verdadeira elite
de passagem que faz suas transações em dólares australianos ou
americanos. Na rua, o povo usa as
rupias indonésias, embora o dólar
dos EUA tenha sido decretado
moeda oficial do país.
Alguns timorenses tiveram a
idéia de reconstruir casas em tempo recorde e alugá-las a funcionários da Untaet. É um raro caso em
que o investimento é local e serve
à obra de reconstrução. É bem
mais frequente que o capital investido seja estrangeiro (sobretudo australiano) e que os investimentos sejam a curtíssimo prazo
e sem consequências futuras, com
estratégias para lucrar imediatamente com a presença de uma elite transitória. Multiplicam-se, assim, os restaurantes. Surgem locadoras de carros e postos de gasolina. São empreendimentos que
não têm tempo para construir ou
reconstruir edifícios. Ao lado das
casas queimadas, é mais simples
pousar contêineres metálicos,
também simples de levar embora.
Há escritórios e até quartos de hotel em contêineres, produzindo
uma paisagem de casas vazias demasiado abertas à luz do céu e caixas metálicas totalmente fechadas, vibrando ao som dos condicionadores de ar.
A pergunta é inevitável: o que
será de Timor, no dia em que a
Untaet for embora? Afinal, o hotel
Olympia é um barco que, a qualquer instante, pode recolher a
passarela.
(CC)
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