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Russos estão felizes com economia, avalia analista
Dinheiro do petróleo e sensação de liberdade nunca antes experimentada, mesmo que restrita, tornam Putin popular
Para Lipman, presidente
não tem concorrentes nas eleições parlamentares e
se ocupa em definir como
continuará no comando
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A MOSCOU
A apatia que o público russo
apresenta na atual campanha
eleitoral tem uma explicação
simples para a analista política
Maria Lipman, do Centro Carnegie de Moscou: a economia
nunca esteve tão bem e há um
grau de liberdade individual associado a estabilidade política
que não tem paralelo na história russa.
Mas e a crescente falta de liberdade de imprensa apontada
por várias instituições, inclusive a de Lipman? "É verdade, há
repressão, a mídia está sob controle do Estado. Mas não é nada
comparado com os tempos da
União Soviética, que ainda estão na lembrança de todos, e o
russo médio está muito satisfeito com seu país e seu presidente", responde ela.
Russa, Lipman é editora da
revista "Pro et Contra", do Carnegie, que é um centro custeado por uma fundação norte-americana.
FOLHA - Putin é mesmo uma figura
de aprovação quase unânime ou isso decorre da distorção causada pelo controle que o governo exerce sobre a mídia?
MARIA LIPMAN - Sim, ele tem
uma aprovação enorme entre
os russos, e a teria mesmo que
não tivesse a mídia na mão. Esse é o período mais próspero e
menos repressivo de que se tem
notícia na história russa, e isso
não é pouco.
FOLHA - Mas isso não é um paradoxo? Há diversos relatos da perda de
liberdades no país.
LIPMAN - Sim, há perdas. Mas a
sensação de bem-estar e de orgulho nacional, associada a
uma máquina eficiente de divulgação dessa sensação, acaba
gerando a ausência de interesse
pela política. A repressão não é
explícita, exceto quando há essas marchas de oposicionistas,
algo muito isolado.
Vladimir Putin enfraqueceu
todas as instituições, exceto a
Presidência, que controla todos
os aspectos da vida pública na
Rússia.
FOLHA - E como ele fará sem a Presidência em mãos? As opções até
aqui são virar premiê, o que implicaria mudar o centro do poder para o
Parlamento, ou a criação do cargo
de líder nacional, ou algo assim.
LIPMAN - Isso é tudo sobre o
que essas eleições agora importam. Como ele vai traduzir a
confiança do público em uma
forma de permanecer no poder.
Dado o seu desprezo pelas instituições, duvido que ele vá reforçar o Parlamento. Algo como essa história de líder nacional [proposta por um movimento suprapartidário chamado Pró-Putin] é mais provável.
Putin é um mistério. Já nos
envergonhamos bastante com
nossas previsões sobre ele. E,
agora, só ele sabe o que vai
acontecer. Ele tem o poder.
FOLHA - O petróleo é o fiador desse
poder, correto?
LIPMAN - Sim, sem a alta nos
preços do produto [desde a invasão do Iraque em 2003 e o
aumento do consumo chinês],
não sei se ele poderia chegar
onde chegou. Mas é bom lembrar que o russo está acomodado. Acomodado e cínico, mas
não estúpido. As pessoas aprovam, de modo geral, o que está
acontecendo.
FOLHA - O fato de a experiência
com a democracia no modelo ocidental ter sido um fracasso, nos
anos de Boris Ieltsin, favorece a retomada do mito do homem forte na
Rússia?
LIPMAN - Sim. Veja a resposta
do público a todas essas provocações contra os EUA feitas por
Putin. Há realmente uma tradição política centralizadora e
paternalista vigente.
FOLHA - Não há nenhum nome
que possa desafiar Putin? Garry Kasparov parece mais popular no exterior do que aqui.
LIPMAN - Não, não há. Poderia
ocorrer algo como aconteceu
na Ucrânia, quando todos os
que eram contra Moscou se
uniram e ganharam a eleição.
Só para se fragmentarem e perderem o poder.
Não há nenhum nome que
aglutine. Para a maioria dos
russos, Kasparov é só um campeão mundial de xadrez. Outros líderes, como Mikhail Kasianov (ex-premiê) e Boris
Nemtsov (União das Forças de
Direita), são reconhecidos, mas
não têm apelo. As gerações
mais antigas ainda votam com
os comunistas, mas elas estão
desaparecendo.
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