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EUA fazem aposta arriscada com pleito
Se eleição hondurenha se mostrar legítima, Washington usará seu peso para fazer com que votação seja aceita na região
Por outro lado, se a votação for mais tumultuada do que se antecipa, a Casa Branca poderá ficar mais isolada na região do que já está hoje
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Os EUA chegam à eleição
presidencial hondurenha de
hoje fazendo sua maior aposta
na relação com a América Latina desde que Barack Obama assumiu a Casa Branca, em janeiro. Se o pleito ocorrer dentro do
mínimo de ordem aceitável para observadores internacionais, de maneira que o Departamento de Estado possa dizer
que o que houve foi "livre, justo
e democrático", Washington
reconhecerá o vencedor.
Então, usará todo o peso do
país para que o resultado seja
aceito tanto dentro de Honduras, onde os EUA respondem
por US$ 2 em cada US$ 3 da
economia e são o principal parceiro militar, como dentro da
OEA (Organização dos Estados
Americanos), onde sua posição
hoje é defendida por uma minoria de países. O segundo caso
é mais complicado, mas, na
avaliação da diplomacia americana, não é sem solução.
Para tanto, os americanos insistirão em dizer aos países-membros que o Acordo Tegucigalpa-San José está em marcha
e que rejeitar o resultado é rejeitar o acordo. O trato prevê,
entre outras coisas, a realização
de eleições -o que já terá ocorrido-, a decisão do Congresso
hondurenho -marcada para
esta quarta- sobre a volta ou
não de Manuel Zelaya ao poder
e a decisão sobre a volta ou não
de Honduras para a OEA, da
qual está suspensa.
A avaliação de Washington é
que, dada a oportunidade e
diante do fato consumado, os
países que rejeitam a legitimidade do pleito, que são maioria
e são liderados pelo Brasil, podem sofrer importantes defecções, de forma a isolar os que
insistirem na posição original.
No melhor cenário com que
trabalha a diplomacia dos EUA,
o grupo ficaria com Brasil, Argentina e poucos mais além dos
bolivarianos (Venezuela, Bolívia, Equador e Nicarágua).
Em encontro com jornalistas
da região na sexta retrasada, do
qual a Folha participou, um alto funcionário do Departamento de Estado havia dito que, feita a contagem um por um, duvidava que o resultado seria 33
países contra e um a favor de
reconhecer o pleito. "Há muitos países que percebem que as
eleições podem ser parte do caminho adiante", disse o diplomata, na condição de não ser
identificado. "Muitos percebem que as eleições têm de ser
parte do pacote."
Na última quarta-feira, a
chanceler mexicana, a esquerdista Patricia Espinosa, pode
ter sinalizado a primeira baixa
de peso do bloco brasileiro. Ela
se afastou da posição anterior
de seu país e começou a repetir
o catecismo americano. O importante, disse ela, é respeitar o
acordo. "Achamos que nos pronunciarmos agora sobre reconhecer ou não o resultado não
é algo que ajude a chegar a uma
solução."
Em entrevista a um jornal
chileno, o próprio secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, deu mostras de que sua
posição é flexível. "Algo teremos de fazer com Honduras,
porque já aprendemos nesses
anos que essas coisas têm de
ser arrumadas rapidamente",
disse. "Não podemos ficar com
Honduras fora da OEA por 30
anos, como aconteceu com Cuba, que está já há quase 40."
Isolamento maior
O problema é que, se as eleições forem mais tumultuadas
do que se antecipa, como ocorreu recentemente no Afeganistão, por exemplo, os EUA podem chegar ao dia de amanhã
ainda mais isolados na região
do que estão hoje.
Insistir em defender um pleito que tenha a aparência de indefensável unirá os outros países contra Washington e reabrirá feridas recentes que esse
governo já coleciona, como o
desastrado anúncio do acordo
militar com a Colômbia e a demora na implantação de uma
política latino-americana digna
do nome.
Se isso acontecer, os EUA retrocederão e passarão o bastão
para a OEA. É nessa hipótese
que aposta Brasília, segundo
manifestações recentes do
chanceler Celso Amorim e do
assessor de assuntos internacionais de Lula, Marco Aurélio
Garcia. A posição conta com
simpatia de boa parte de analistas e formadores de opinião.
Para Mark Weisbrot, codiretor do progressista Center for
Economic and Policy Research
(CEPR), de Washington, os
EUA podem até tentar fazer o
que ele chama ironicamente de
"coalizão da boa vontade" em
relação às eleições em Honduras, mas fracassarão. "Por mais
que os líderes latino-americanos possam gostar de Obama
pessoalmente, seu Departamento de Estado está conseguindo fazer seu governo tão
isolado na região quanto o de
seu antecessor", disse à Folha.
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