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DIREITOS HUMANOS
Cada torturado durante a ditadura de Pinochet receberá pensão mensal de R$ 520, decide presidente Lagos
Relatório afirma que Chile torturou 28 mil
DA REDAÇÃO
Passados quase 15 anos desde o
fim do regime militar, o Chile deu
no domingo novo passo no acerto
de contas com seu passado, ao divulgar o relatório final da Comissão Nacional sobre Prisão Política
e Tortura. Segundo o documento,
foram torturadas 28 mil pessoas.
O presidente Ricardo Lagos
anunciou que cada uma receberia
uma pensão vitalícia equivalente
a R$ 520 mensais. "A prisão política e as torturas foram uma prática
institucional do Estado", disse o
presidente chileno.
A comissão que elaborou o relatório recolheu 35 mil depoimentos de testemunhas e vítimas da
ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990). Seus trabalhos foram presididos pelo bispo
católico Sérgio Valech.
Não houve uma recontagem
dos mortos e desaparecidos. Permanece válido um estudo oficial
de 1991, segundo o qual a ditadura
matou 3.197 dissidentes.
O texto, de 1.200 páginas, não
foi comentado ontem pelo general Juan Emílio Cheyre, comandante do Exército. Disse apenas
que os militares continuariam a
apoiar a reconciliação e a "assumir a verdade do passado".
No começo deste mês, prevendo a publicação do relatório, ele
divulgou nota na qual disse que o
Exército "tomou a decisão sólida
e irreversível de assumir as responsabilidades" com relação a fatos "puníveis e inaceitáveis".
O presidente da Conferência
Episcopal do Chile, Alejandro
Goic, disse que o documento deve
ser lido como uma grande lição
"para que jamais se volte a violentar a sagrada dignidade humana".
A UDI, partido descendente da
direita pinochetista, divulgou nota em que "condena de forma
mais absoluta" os abusos apontados pelo relatório Valech e afirma
que a indenização das vítimas "é
uma obrigação da sociedade".
Conceito e números
O relatório se contrapõe às teses
que prevaleceram entre os partidários de Augusto Pinochet, de
que o país se encontrava numa
"guerra interna" durante a ditadura, e de que as violações dos direitos humanos foram acidentes
excepcionais.
Não ocorreram focos de resistência ao golpe de 11 de setembro
de 1973. Os militares não estavam
em guerra contra um inimigo interno, mas num acerto de contas
contra dissidentes em potencial,
argumenta o documento.
O relatório cita 1.131 prisões,
parte delas clandestina, em que
interrogatórios eram feitos de
modo violento. Em Santiago funcionaram 161 locais de tortura. O
documento também desmente a
versão de que os abusos foram cometidos apenas nos meses que se
seguiram ao golpe. Pouco mais de
32% dos torturados foram presos
entre 1974 e 1990.
A ditadura prendeu e torturou
1.080 menores de 18 anos. Ela fez o
mesmo com 3.399 mulheres. Nove a cada dez disseram ter sofrido
violências sexuais. Uma adolescente de 14 anos foi obrigada a fazer sexo oral com três carcereiros.
O texto não revela o nome das
vítimas nos casos que relata. Mas
traz um anexo com o nome de todos os torturados. A ligação entre
eles e os fatos relatados só será divulgada dentro de 50 anos.
"Deram-me drogas, fizeram-me fazer sexo com cachorros e colocaram ratazanas em minha vagina", relatou uma das vítimas,
em depoimento que a comissão
afirma ter comprovado.
O perfil de militância do chileno
torturado fica patente no relatório. Eram filiados ao Partido Socialista 22%, enquanto 21% eram
membros do Partido Comunista.
Os dois partidos compunham a
Unidade Popular, do presidente
deposto Salvador Allende. Pertenciam à extrema esquerda 6%, e
31% diziam não exercer atividades num partido específico.
Críticas ao Judiciário
O relatório critica o comportamento do Judiciário, sobretudo a
Corte Suprema, por ter abdicado
do controle dos tribunais militares. Apenas em Santiago, entre o
golpe e 1989, juízes de instância
inferior deixaram de examinar 9
mil casos de prisões ilegais. Esses
magistrados se pautavam pelos
ministros da Corte Suprema, que
"ampararam as sistemáticas violações dos direitos humanos por
agentes do Estado ou por pessoas
a seu serviço", diz o relatório.
O texto também critica a imprensa, que "apresentou o trabalho da repressão como se fosse
uma cruzada contra a delinqüência", dando tratamento a líderes
da oposição análogo ao que era
dado a criminosos.
Uma centena de vítimas e parentes se reuniu ontem diante do
palácio de La Moneda, sede do
Executivo, para protestar contra
reparação material julgada insuficiente. Outros disseram que o relatório é incompleto porque não
identifica os torturadores.
Com agências internacionais
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