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ARTIGO
"Precisamos chegar a um consenso em relação a Cuba"
JIMMY CARTER
Uma charge publicada enquanto eu estava em Cuba me mostrava sozinho em um pequeno bote salva-vidas no Caribe, rodeado por tubarões. A legenda dizia: "Eu
não devia ter pedido ao presidente Bush uma carona para casa".
Na realidade, os objetivos da Casa Branca e do Centro Carter
são iguais: ver uma completa liberdade chegar a Cuba e, nesse
meio tempo, estabelecer relações amigáveis entre os povos dessas
duas nações. Mas os meios para obter esse fim são bem diferentes.
Uma abordagem é continuar o esforço em vigor há quatro décadas
de isolar e punir Cuba com visitas
restritas e um embargo econômico. Outra é permitir aos americanos terem o máximo de contato
com os cubanos para que eles vejam claramente as vantagens de
uma verdadeira sociedade democrática e sejam estimulados a implementar mudanças estruturadas em sua sociedade.
Nos Estados Unidos, ambos os
lados se polarizaram, com alguns
imigrantes cubanos com poder de
influência política alinhados com
a maior parte do governo em
Washington para se opor a qualquer mudança significativa em
nossa política. Por outro lado, um
número crescente de executivos e
líderes agrícolas se aliou a congressistas moderados a fim de pedir a redução das tensões e relações mais normais com a população de Cuba. O impasse estagnante tirou de nosso país uma oportunidade de alcançar nossos objetivos comuns.
Há sinais de abertura e reforma
em Cuba. Pela primeira vez desde
a revolução realizada 43 anos
atrás, os cubanos puderam ouvir
uma voz clara pedindo liberdade
de expressão e reunião, a organização de sindicatos trabalhistas e
partidos políticos de oposição,
eleições livres e a admissão de inspetores de direitos humanos e da
Cruz Vermelha Internacional.
Surpreendentemente, e sem que
eu solicitasse, o texto inteiro de
meu discurso foi transmitido na
televisão e no rádio e publicado
no "Granma", o jornal oficial.
Nós encontramos um grau de liberdade econômica inesperado.
Empresários podem comprar
produtos agrícolas de famílias rurais e cooperativas, processar carne, vegetais e frutas e vender os
produtos acabados em barracas
públicas. Nós visitamos um grande mercado em Havana, com 700
barracas, todas promovendo negócios prósperos. Além disso, alguns proprietários de casas têm licença para alugar quartos vagos a
cubanos ou estrangeiros, donos
de caminhões podem transportar
mercadorias e artesãos podem
contratar o serviço deles. Embora
modestos para nossos padrões,
esses avanços indicam uma flexibilidade não evidente antes.
Há poucas dúvidas de que reformas adicionais sejam obstruídas por exigências severas de
Washington ou Miami, que alienam os cubanos e criam a percepção de que qualquer novo movimento seria um sinal de fraqueza.
Os dissidentes com os quais nos
encontramos em Cuba foram
unânimes em querer ver menos
retórica severa, mais visitas americanas, fim do embargo econômico no que diz respeito a comida
e remédios e nenhuma conexão
financeira direta ou indireta entre
eles e o governo dos EUA. O desafio agora é chegar a um consenso
ao lidar com Cuba em que o Congresso, grupos privados e a administração possam cooperar.
Há algumas possibilidades que
seriam úteis aos cidadãos cubanos sem conferir a nenhum dos
lados uma vitória política ou de
propaganda. A chave é realçar as
relações pessoa-a-pessoa, especialmente através de intercâmbios culturais. Isso envolveria, naturalmente, diversão e esporte,
mas também ciência, medicina,
educação e agricultura.
Cuba tem um excelente sistema
de educação e saúde. Alianças entre especialistas cubanos e americanos nesses campos poderiam
ser benéficas para ambos os países. Outra necessidade é começar
debates discretos entre americanos de origem cubana moderados
e líderes cubanos, talvez orquestrados por partidos neutros. Ambos os governos teriam de suavizar sua política em relação à concessão de vistos.
Algumas acusações foram levantadas sobre bioterrorismo. É
verdade que cientistas cubanos
têm capacidade técnica de produzir toxinas, como muitos milhares
de outros no mundo todo. A melhor forma de responder à questão e evitar qualquer tentação de
atividades ilícitas é que os pesquisadores trabalhem lado a lado em
laboratórios e troquem informações livremente em conferências
internacionais. A mulher do ministro das Relações Exteriores de
Cuba é uma cientista médica renomada que se especializou em
câncer. Ela sempre teve liberdade
de participar de conferências que
tenham a ver com o seu trabalho,
mas os EUA se recusaram a lhe
conceder um visto enquanto nós
estávamos em Havana. Seria útil
eliminar essas restrições.
Uma oferta recíproca que já
existe é a ação de providenciar
bolsas universitárias a estudantes
de graduação. O presidente George W. Bush ofereceu recentemente essa oportunidade a estudantes
cubanos, e o presidente Fidel Castro ofereceu seis anos de educação
médica a futuros médicos dos Estados Unidos.
Visitas diretas de cidadãos em
geral também são úteis. Um programa notável é a Força Amizade,
que propicia essa oportunidade a
americanos que queiram ir a Cuba. Os viajantes permanecem em
hotéis durante três noites e em casas particulares durante o restante
da semana, com a possibilidade
de observar pessoalmente como
nossos vizinhos geográficos vivem.
Eu gostaria de ver um comércio
irrestrito e visitas entre Cuba e os
Estados Unidos, assim como desejariam muitos americanos e um
forte e crescente grupo de imigrantes cubanos em Miami. Até
que esse objetivo seja politicamente possível, nós deveríamos
adotar outros passos modestos em direção à reconciliação.
O ex-presidente dos EUA Jimmy Carter (1977-81) preside o Centro Carter, em
Atlanta, uma organização não-governamental que afirma ter como um de seus
principais objetivos a promoção de saúde e educação. No meio deste mês, Carter foi autorizado pela Casa Branca a visitar Cuba, onde se reuniu com Fidel Castro. Foi o primeiro encontro de um ex-presidente americano com o ditador cubano desde o rompimento das relações diplomáticas entre os dois países, em
1961. A viagem do ex-presidente foi agendada após convite de Fidel
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