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"GUERRA SUJA"
Presidente apóia revogação de leis; outros quatro países se preparam para pedir extradição
Kirchner quer julgar repressores na Argentina
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
O presidente da Argentina, Néstor Kirchner, defendeu ontem
que os acusados de abusos contra
os direitos humanos durante a última ditadura militar (1976-1983)
sejam julgados na Argentina.
Kirchner disse considerar que
as leis do Ponto Final e da Obediência Devida, que garantiram a
impunidade aos militares e ex-militares acusados de abusos, devem ser declaradas inconstitucionais. As leis, que entraram em vigor no governo Raúl Alfonsín
(1983-1989), para acalmar os militares após tentativas de golpe, já
foram julgadas inconstitucionais
pela Justiça, mas a Suprema Corte
ainda deve dar a palavra final.
"Os repressores deveriam ser
condenados na Argentina, só não
foram ainda porque há leis que favorecem a impunidade", disse.
A Justiça ordenou na semana
passada a prisão de 46 ex-repressores cuja extradição é requerida
pela Espanha. A prisão foi ordenada após Kirchner revogar decreto de 2000 que impedia a extradição de ex-repressores.
A possibilidade de que que argentinos sejam extraditados e julgados por outros países tem gerado polêmica. Alguns analistas dizem que a medida fere a soberania nacional e que os ex-repressores devem ser julgados no país.
Segundo pesquisa do instituto
Ricardo Rouvier & Asociados, divulgada ontem, 65% dos moradores da Grande Buenos Aires defendem que os ex-repressores detidos sejam julgados no país.
Após ser questionado sobre a
questão, Kirchner afirmou que
deve-se "terminar com a hipocrisia da soberania de que que têm
que ser julgados na Argentina".
"Se desaparecerem as normas que
geraram a impunidade, poderão
ser julgados na Argentina", disse.
"São duas normas que foram
obtidas sob a extorsão de um golpe de Estado", disse Kirchner.
"Acho que seria bom se o Congresso sancionasse a nulidade das
leis. Espero que não tenha questionamentos do tipo jurídico."
O Congresso também estuda a
possibilidade de anular as leis,
medida questionada por juristas.
Eles dizem que os legisladores
não têm poder para isso pois ambas as leis foram aprovados pelo
Congresso durante um governo
democrático. Segundo eles, só a
Suprema Corte tem poder para
declará-las inconstitucionais.
Para militantes de organizações
de defesa dos direitos humanos,
os torturadores devem ser punidos, em qualquer país. "O ideal
seria julgá-los aqui, mas como isso não é possível, que seja fora do
país", disse Hebe Bonafini, da Associação Mães da Praça de Maio.
Mais pedidos
França, Alemanha, Itália e Israel
preparam-se para encaminhar à
Argentina mais pedidos de extradição para julgar ex-repressores
argentinos. A França quer pedir a
extradição do ex-oficial da Marinha Alfredo Astiz. Em 1990, ele foi
condenado à prisão perpétua por
tribunais franceses por participar
do sequestro e assassinato de
duas freiras franciscanas.
Astiz, 50, conhecido como "Anjo Loiro", está ainda numa lista de
sete ex-militares extraditáveis elaborada pela Itália. No seu caso, a
Justiça argentina definiria para
qual país seria concedida a extradição. A decisão dependerá do
número de casos e da importância de cada um deles. A conclusão
de um processo de extradição pode levar meses, às vezes anos.
O governo argentino também
espera solicitações da Alemanha e
de Israel. O Parlamente israelense
encaminhou ao primeiro-ministro Ariel Sharon uma resolução
que pede o julgamento de ex-militares argentinos que cometeram
crimes contra judeus na ditadura.
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