São Paulo, segunda-feira, 06 de dezembro de 2010

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AMERICANAS

A solução nem sempre está no exorcismo

Por LAURIE GOODSTEIN

O ritual do exorcismo, mais popular na Europa, África e América Latina, praticamente caiu em desuso por parte da Igreja Católica nos EUA. Mas os poucos padres do país treinados como exorcistas se dizem sobrecarregados com pedidos de pessoas que temem estar possuídas pelo demônio.
Tamanha é a demanda que os bispos americanos realizaram conferência para ajudar o clero a saber distinguir entre pessoas que precisam de exorcismo e as que precisam de psiquiatra.
"Nem todo mundo que pensa que precisa de exorcismo realmente precisa", disse o bispo Thomas Paprocki, de Springfield (Illinois), que organizou a conferência. "Ele só é usado em casos no qual o demônio está envolvido de uma forma extraordinária, em termos de estar possuindo a pessoa. Mas é raro, é extraordinário. O uso do exorcismo também é raro e extraordinário, mas temos de estar preparados."
O exorcismo é tão velho quanto o cristianismo. O Novo Testamento tem relatos de Jesus expulsando demônios.
Richard Vega, presidente da Federação Nacional dos Conselhos Sacerdotais, disse que a demanda pelo exorcismo pode vir a aumentar, devido ao maior afluxo de católicos hispânicos e africanos para os EUA.
Pessoas dessas culturas, afirmou, estão mais sintonizadas com o sobrenatural.
A conferência a portas fechadas ocorreu em Baltimore (Maryland), antes da reunião anual dos bispos dos EUA. Alguns comentaristas católicos se disseram intrigados com o interesse dos bispos pelo exorcismo, num momento em que têm de enfrentar problemas como o fechamento de paróquias e escolas, pesquisas mostrando a perda de um a cada três fiéis brancos batizados, além dos escândalos de abuso sexual.
Para Scott Appleby, professor de história católica americana na Universidade de Notre Dame, em South Bend (Indiana), o momento é propício.
"O que eles estão tentando fazer", disse Appleby, "é fortalecer e reforçar o que parece estar perdido na igreja, que é uma sensação de que a igreja é diferente de qualquer outra instituição". "Ela é sobrenatural, e os principais agentes nisso são a hierarquia, e os padres que podem receber as faculdades de exorcismo."
"É uma estratégia para dizer: 'Não somos o Federal Reserve, o banco central dos EUA, e não somos o Conselho Mundial de Igrejas, nós lidamos com anjos e demônios'."
O papa Bento 16 tem enfatizado um retorno aos rituais e às práticas tradicionais, e alguns observadores dizem que o interesse dos bispos pelo exorcismo é consistente com a orientação do pontífice. O Vaticano já autorizou a retomada da Missa Latina, e, no ano que vem, uma nova tradução da liturgia para o inglês deve ser adotada nas paróquias americanas.
O ritual do exorcismo se baseia numa oração em que o padre evoca Jesus. Os padres usam água benta e uma cruz e podem alterar a oração dependendo da reação do possuído, segundo Matt Baglio, jornalista radicado em Roma e autor de "The Rite: The Making of a Modern Exorcist" (o rito: a feitura de um exorcista moderno).
"A oração vem do poder do nome de Jesus e da igreja. Não vem do poder do exorcista. O padre não tem o poder mágico", disse Baglio, cujo livro está sendo transformado em filme.
Há muito cinismo sobre o exorcismo. Baglio notou que enganadores se aproveitam dos crédulos, causando-lhes danos físicos e espirituais.
Com tão poucos padres exorcistas, e com o estigma que cerca a prática, os exorcistas evitam se identificar. Esforços para entrevistá-los não deram certo.
Alguns dos clássicos sinais de possessão demoníaca, disse o bispo Paprocki, incluem falar em línguas que a pessoa nunca aprendeu, demonstrações extraordinárias de força, uma repentina aversão por coisas espirituais, como a água benta ou o nome de Deus, insônia severa, inapetência e o hábito de se cortar, arranhar ou morder.
Uma pessoa que se diz possuída precisa ser examinada por médicos que descartem uma doença, segundo diretrizes emitidas em 1999 pelo Vaticano, revogando regras que vigoravam desde 1614.
Paprocki lembrou que o demônio é uma força real e constante, embora pouca gente precise de exorcismo para lidar com ele. "O trabalho ordinário do demônio é a tentação", disse, "e a resposta ordinária é uma boa vida espiritual, observando os sacramentos e rezando". "O demônio não possui alguém que esteja levando uma boa vida espiritual."


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