São Paulo, segunda-feira, 10 de outubro de 2011

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Escambo contra a crise

Por RACHEL DONADIO

VOLOS, Grécia - Na primeira vez em que comprou ovos numa feira não usando euros, mas uma moeda informal de permuta, Theodoros Mavridis, um eletricista desempregado, emocionou-se.
"Me senti livre pela primeira vez", contou o eletricista nesta cidade portuária da Grécia central. "Pus a mão no bolso instintivamente, mas não era necessário."
Mavridis é co-fundador de uma rede crescente aqui em Volos que utiliza uma chamada Unidade Alternativa Local, (TEM, em grego) para trocar bens e serviços -como aulas de música ou idiomas, suporte técnico em informática, preparo de refeições caseiras- e receber descontos em estabelecimentos locais.
Em parte moeda alternativa, em parte sistema de permuta, em parte feira ao ar livre, a rede de Volos vem crescendo exponencialmente nos últimos 12 meses, passando de 50 a 400 membros. Ela é um dos vários grupos do tipo que surgiram no país, na medida em que os gregos constritos por grandes reduções salariais, aumentos de impostos e temores recentes quanto às chances de continuarem ou não a usar o euro vêm procurando maneiras criativas de enfrentar uma cena econômica em radical transformação.
"Desde que a crise começou, vem ocorrendo um boom de redes como esta em toda a Grécia", disse George Stathakis, professor de economia política e vice-reitor da Universidade de Creta.
O governo grego está tomando nota. Recentemente o Parlamento aprovou uma lei para incentivar a criação de "formas alternativas de empreendedorismo e desenvolvimento local".
Em Volos, o grupo trabalha em paralelo à economia regular, inspirados pela necessidade de solidariedade.
"Não somos revolucionários, nem sonegadores de impostos", disse a aposentada Maria Houpis, uma das fundadoras do grupo. "Aceitamos as coisas como elas são."
O conceito do grupo é simples. Um TEM é igual a um euro. Os membros começam com zero em suas contas e ganham crédito ao oferecer bens e serviços. Também recebem talões de vales.
Vários profissionais de Volos, incluindo um veterinário e uma costureira, aceitam a moeda alternativa em troca de um desconto sobre o preço em euros.
Para Houpis, a rede tem dimensões psicológicas. "Você tem muito mais dinheiro do que aparece em sua conta bancária", disse ela. "Você tem sua cabeça e suas mãos."
Depois de anos de consumismo descarado e crédito fácil, iniciativas como essa revelam o clima novo no país, onde a austeridade imposta vem levando as pessoas a se unirem -não apenas para fazer protestos em massa, mas também para se ajudarem. Quando os ônibus e metrôs de Atenas entraram em greve, em setembro, os atenienses lotaram o Twitter em busca de caronas coletivas.
Com o desemprego em 16% e a economia encolhendo, os gregos esperam o pior.
"Estamos em uma área não mapeada", disse Christos Papaioannou, que comanda o site da rede na internet. "Muitas coisas vão mudar. Talvez isso seja o começo do futuro."


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