São Paulo, segunda-feira, 11 de abril de 2011

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Os Borgias foram feitos para a TV

Uma família de tipo mafioso na Renascença

Por CHARLES McGRATH
Os Borgias viveram nos séculos 15 e 16, mas é como se tivessem sido feitos para a televisão a cabo. Tema de uma nova minissérie, eles eram ricos, implacáveis, corruptos e dotados de tão grande voracidade sexual que dormiam com todo o mundo, incluindo uns com os outros.
Mario Puzo, autor de um romance sobre eles, descreveu os Borgias como a versão renascentista da família Corleone, de "O Poderoso Chefão". Eles também lembram "A Família Soprano". Imagine se Tony Soprano, em lugar de administrar uma empresa de remoção de lixo, tivesse comprado o papado para si.
"The Borgias" foi criado, escrito e produzido pelo diretor de cinema Neil Jordan para a rede americana de TV a cabo Showtime, que começou a exibir a minissérie em 3 de abril. O patriarca da família Borgia, Rodrigo, que se tornou o papa Alexandre 6°, é representado por Jeremy Irons, que não possui exatamente o "physique du rôle". O Rodrigo Borgia histórico aparentava ter sido inflado. Quando morreu, estava tão inchado e degradado que, quando seu corpo foi posto no féretro, foi preciso que alguém pulasse sobre a tampa para fechá-la.
Ainda elegantemente belo aos 62 anos de idade, Jeremy Irons, tanto na tela quanto em pessoa, possui um quê de levemente distanciado e majestoso, uma inteligência aguçada e ágil e, ocasionalmente, um ar de melancolia cansada de tudo "todos atributos papais muito úteis. Ele também possui um longo histórico de representar personagens moralmente ambíguos: Humbert Humbert em "Lolita"; os ginecologistas gêmeos em "Gêmeos " Mórbida Semelhança", de David Cronenberg; Claus von Bulow em "O Reverso da Fortuna" (pelo qual recebeu um Oscar), até mesmo Scar em "O Rei Leão". E, com sua voz grave, ele soa como um papa renascentista deveria soar, sugerindo conhecimentos adquiridos fora do seminário.
Ninguém foi mais cinzento que Rodrigo Borgia, que comprou o papado em uma eleição falsificada, teve diversas amantes e quatro filhos, mas foi também um diplomata habilidoso e renomado patrono das artes. Neil Jordan disse que, em sua opinião, toda a família Borgia foi prejudicada por ter sido representada como pior do que foi de fato: "Boa parte da história foi escrita pelos sucessores de Rodrigo, especialmente o cardeal Giuliano della Rovere, que se tornou o papa Júlio 2°. Não houve Edward Gibbon ou Niall Ferguson para escrever sobre os Borgias, que, por essa razão, acabaram por ser um pouco demonizados."
Jordan disse ainda que o que achou interessante, quando escreveu o roteiro, foi que, quando Rodrigo era tirado do contexto de sua família, continuava a ser atraente, por pior que tivesse se tornado. Estranhamente, o vilão de "The Borgias" é o rival de Rodrigo, Della Rovere (representado por Colm Feore), um exemplo de probidade e santidade.
Jeremy Irons contou que, quando pesquisou o papel, redigiu uma lista de todas as características atribuídas a Rodrigo Borgia. "Era como um arco-íris", comentou. "A lista vai desde ‘homem generoso’, ‘ótima companhia’, ‘grande organizador’ até ‘envenenador’, ‘cruel’ e ‘déspota’ "todos os piores adjetivos que se poderiam imaginar. Pensei: ‘Isso é muito interessante. Talvez seja tudo verdade. Talvez todos esses adjetivos possam ser vistos como verdadeiros, dependendo do ponto de vista.’ O cinema sempre é uma colcha de retalhos, de qualquer maneira, e minha esperança é que Rodrigo emerja como um homem de muitas cores e muitos comportamentos distintos. Ele se mostra completamente diferente, dependendo de estar sendo persuadido por sua filha, pressionado pela mãe de seus filhos ou negociando com o embaixador espanhol. Eu nunca julgo. Isso não cabe a mim. Apenas procuro interligar todos esses atributos.
Jordan comentou: "Jeremy realmente consegue humanizar o monstro, não? Eu o adorei como Claus von Bulow. Você não tinha absolutamente nenhuma ideia de o que o personagem estava pensando."
Em relação a representar um papa, personagem que está sempre sendo tratado com deferência enquanto é carregado em um trono ou perambula pelo palácio em suas vestes pontificais, Irons falou: "É uma maluquice, mas alguém precisa fazer isso". Mas então prosseguiu em tom sério: "Espero que o Vaticano não percorra o caminho óbvio de criar uma grande controvérsia em relação a isto (a minissérie), mas aposto que a Showtime adoraria isso".
Ele acrescentou: "Acho que o grande ponto positivo do roteiro de Neil está no fato de ele (Jordan) ser um homem muito inteligente, um historiador muito lido; ele encontrou algo que possivelmente chegue mais perto da verdade em relação aos Borgias, se bem que só Deus sabe qual é a verdade de fato. Espero que o público fique totalmente confuso, sem saber se deve ou não torcer por esse homem. É um pouco como Von Bulow, sabe. Ele cometeu o crime ou não?"


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