São Paulo, segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

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ENSAIO

N. GREGORY MANKIW

Não é hora para protecionismo

Que abordagem o governo de Barack Obama e a maioria democrata no Congresso dos EUA darão à política econômica internacional? É cedo para dizer, mas os sinais até agora têm sido preocupantes.
Pouco antes da sua confirmação como secretário do Tesouro, Timothy Geithner desafiou os chineses por conta da taxa de câmbio dólar/yuan. O presidente Obama, disse ele, "acredita que a China está manipulando sua moeda". "Países como a China não podem continuar tendo passe livre para solapar os princípios do comércio justo", acrescentou.
Como muitos economistas, me arrepio sempre que ouço o termo "comércio justo". Em geral, o slogan não passa de uma palavra de ordem em prol do protecionismo.
Dias depois de Geithner apontar o dedo contra a China, Wen Jiabao, primeiro-ministro chinês, apontou o dedo de volta. Falando no Fórum Econômico Mundial em Davos, Wen culpou os EUA pela crise econômica que o mundo atravessa. Falou em particular sobre "o fracasso da supervisão financeira".
Provavelmente, Wen estava ciente de que um dos atores importantes no sistema de supervisão nos EUA era Geithner, que até recentemente presidia o Fed (Banco Central) de Nova York. Wen poderia estar sugerindo -corretamente- que o novo secretário do Tesouro deveria voltar suas energias para consertar problemas um pouco mais próximos de casa. Mas será que Geithner tem razão? Os americanos são mesmo prejudicados pela política cambial chinesa?
Críticos da China dizem que Pequim mantém o yuan desvalorizado para obter vantagem no mercado internacional. O yuan mais barato torna produtos chineses menos caros nos EUA e produtos americanos mais caros na China. Por isso, os produtores americanos acham difícil competir com mercadorias chinesas.
Há, porém, um outro lado da história. O prejuízo dos produtores americanos é acompanhado de um ganho para milhões de consumidores dos EUA que preferem pagar menos por camisetas e televisores importados da China.
Geithner e outros críticos da China poderiam também ponderar como os chineses mantiveram o yuan desvalorizado. A essência da política é fornecer yuans e exigir dólares no mercado cambial. Os dólares que a China acumula nessas transações são então investidos em títulos do Tesouro americano.
Então, quando o secretário do Tesouro se queixa do yuan desvalorizado, sua mensagem aos chineses se resume ao seguinte: parem de nos emprestar dinheiro. No momento em que os EUA enfrentam déficits orçamentários excepcionalmente grandes, o mais alto funcionário financeiro da nação deveria pensar cuidadosamente antes de elevar o tom com um de seus maiores credores.
A queixa de Geithner também parece ultrapassada. A cotação yuan/dólar se deslocou consideravelmente nos últimos anos. Após um longo período de câmbio totalmente fixo, a China permitiu que sua moeda começasse a se mexer em julho de 2005. Desde então, ela se valorizou 21%.
Geithner pode achar que o yuan precisa subir mais, mas por que ressaltar tanto o tema neste momento específico? Olivier Blanchard, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, acertou quando disse que "provavelmente não é a hora certa para focar na taxa de câmbio chinesa, já que ela não é um elemento central da crise mundial". "Há muitas outras coisas nas quais deveríamos pensar", afirmou.
Voltar as atenções para a moeda chinesa em meio a uma recessão mundial e a crescentes temores de uma depressão é mais do que uma distração. É claramente contraproducente. Os senadores Charles Schumer (democrata) e Lindsey Graham (republicano) há muito propõem lidar com a desvalorização do yuan impondo tarifas sobre as importações chinesas. Os comentários do secretário do Tesouro ameaçam atiçar essas brasas protecionistas.
Apesar de ter convocado muitos economistas de primeira linha, com impecáveis credenciais de livre comércio, Obama tem sido pouco incisivo em sua oposição pública a este protecionismo sorrateiro.
Pode ser uma boa hora para lembrar o legado do senador Reed Smoot e do deputado Willis Hawley, ambos republicanos. A lei tarifária de 1930 que leva o nome deles não provocou a Grande Depressão, mas contribuiu para afundar o comércio mundial e indubitavelmente foi um passo na direção errada.
Ao sairmos dos destroços da nossa crise econômica, um recuo para o isolacionismo é um equívoco que queremos ter certeza de não repetir.


N. Gregory Mankiw é professor de economia em Harvard e foi consultor do ex-presidente George W. Bush


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