São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2010

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Na minúscula vida marinha, a formação do petróleo do mundo

Por WILLIAM J. BROAD

A ideia de que os combustíveis fósseis derivavam dos restos mortais dos dinossauros perdurou por décadas. Mas hoje um dos mais importantes preceitos da geologia é que a maior parte do petróleo do mundo não surgiu das feras terrestres, mas de pequenos organismos marinhos.
Nevascas de vida microscópica caíram nas profundezas escuras ao longo das eras, produzindo espessos sedimentos que o calor interno do planeta cozinhou lentamente, formando o petróleo. Estima-se que 95% ou mais do petróleo mundial tenha origem no mar.
"É a teoria dominante", disse David A. Ross, cientista emérito do Instituto Oceanográfico Woods Hole, em Massachusetts. Os geólogos descobriram que os leitos de sedimentos marinhos são "um bom indício" de onde descobrir petróleo, ele disse.
A teoria também explica a prospecção em alto-mar, ou "offshore" -por que há petróleo em tantos leitos marinhos, por que é mais frequente perto do litoral do que no abismo e por que, apesar do vazamento no golfo do México, os especialistas dizem que a perfuração em alto-mar poderá aumentar: conforme as reservas em terra diminuem, segundo geólogos, os altos custos e os riscos da exploação em alto-mar vão parecer menos onerosos e mais aceitáveis.
Algumas águas ancestrais que formaram o petróleo do planeta ainda existem, como o golfo do México, enquanto outras desapareceram há muito tempo, como o oceano que produziu os campos petrolíferos do Oriente Médio.
Em um primeiro indício da origem do petróleo na vida marinha, as descobertas de depósitos sempre foram associadas a antigos leitos de rocha sedimentar -do tipo que se forma quando detritos descem pela água durante eras e lentamente se acumulam em espessas camadas no fundo do mar.
O processo geralmente começa em mares quentes. A produção de petróleo inicia quando as águas da superfície se tornam tão ricas em vida microscópica que a "chuva" de detritos supera a decomposição no leito marinho.
Dorrik Stow, geólogo de petróleo da Universidade Heriot-Watt, em Edimburgo, disse que o fluxo de nutrientes nas águas superficiais -vindo em parte dos rios de regiões costeiras, em parte da elevação pelas correntes do fundo- determina a riqueza da vida microscópica e, finalmente, a abundância de petróleo.
Segundo Stow, esses surtos de nutrientes podem gerar "uma orgia biológica" de reprodução que, afinal, termina na "morte negra". A lama preta é cheia de vestígios de vida e, eventualmente, forma rochas sedimentares.
A história do golfo do México mostra que muitos fatores ambientais se uniram para produzir enormes reservas de petróleo.
Talvez o mais importante seja que os grandes rios e vias aquáticas da América do Norte enviaram ricos fluxos de nutrientes para o antigo golfo. O geólogo Scott Tinker disse que os fluxos de lama e sedimentos não apenas alimentaram a vida microscópica como também formaram barreiras rochosas que selaram os detritos orgânicos do mundo exterior.
O crescente acúmulo empurrou as camadas de sedimentos inferiores para dentro da terra, obrigando-as a entrar em zonas quentes, onde o material orgânico virou petróleo após reações químicas.
"O golfo tem quilômetros e quilômetros de sedimentos", disse Tinker. "Isso faz as rochas de origem descerem para a `cozinha`, onde são preparadas." A temperatura padrão para a formação de petróleo é entre 49 e 99° C. A terra torna-se cada vez mais quente conforme aumenta a profundidade.
O contexto ambiental do golfo também ajudou a formação de óleo. O antigo corpo estava de modo geral isolado das influências diluentes do mar global mais amplo, concentrando nutrientes e lama.
"Um motivo pelo qual funciona como um importante recurso mundial é que esteve quase todo isolado dos oceanos globais", disse o geólogo William Galloway. As restrições aos fluxos hídricos ajudaram a determinar onde o petróleo se formou, dizem cientistas. O mar de Tethys -antigo oceano que rodeava o equador no período Cretáceo, há cerca de 100 milhões de anos, no auge da era dos dinossauros- tornou-se uma região produtora.
Quando a maior parte do Tethys se fechou (seus vestígios incluem os mares de Aral, Negro, Cáspio e Mediterrâneo), suas praias férteis formaram os cerca de 12 países do Oriente Médio que produzem dois terços do petróleo mundial.
O que Stow chamou de "acidente geológico" também ocorreu quando a África e a América do Sul lentamente se separaram, no período Cretáceo. Um frenesi biológico no litoral ocidental do oceano acabou formando os campos de petróleo que hoje são explorados nas águas profundas do Brasil.
"Não se trata de dinossauros", disse Kenneth Peters, geoquímico do petróleo na Universidade Stanford. "Qualquer tipo de material orgânico pode contribuir, sim. Mas, se você examinar a cadeia alimentar eles estão bem no topo. São os pequeninos que importam."


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