São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 2008

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O presidente eleito, amigo no Facebook

DAVID CARR

Em fevereiro de 2007, um amigo ligou para Marc Andreessen, fundador da Netscape e membro do conselho diretivo do Facebook, e o convidou para conhecer um homem com uma idéia que, à primeira vista, soava absurda.
O homem perguntou se as redes sociais, com suas enormes capacidades de comunicação e seu desenvolvimento de bancos de dados, poderiam ajudá-lo a superar a desvantagem avassaladora que enfrentava.
Como acabou comprovado, o presidente eleito Barack Obama tinha razão.
Como muitos inovadores na web, a campanha de Obama não inventou nada que fosse inteiramente novo. Em lugar disso, ao reunir aplicativos de rede social sob a bandeira de um movimento, ela criou uma força imprevista para o levantamento de fundos, a organização local, o combate a campanhas de difamação e a mobilização de eleitores —força essa que ajudou a derrubar a máquina eleitoral dos Clinton e, em seguida, John McCain e os republicanos.
O resultado disso é que, quando assumir o poder, Obama já contará não apenas com uma base política, mas também com um banco de dados formado por milhões de nomes de partidários que poderão ser convocados quase instantaneamente. E há todas as razões para se acreditar que ele fará uso dessa rede. A mensagem de e-mail que enviou a seus partidários na noite da eleição incluiu um trecho dizendo: “Temos muito trabalho pela frente para recolocar nosso país no rumo certo, e estarei em contato em breve para comunicar qual será o próximo passo”. A próxima administração americana já está aberta e funcionando na web, no site Change.gov.
“Outros políticos que conheci sempre ficam impressionados com a web, mas seu interesse mais ou menos se limitava a saber quanto dinheiro podiam levantar”, contou Andreessen. Já Obama, em contraste, “foi o primeiro político com quem tratei que compreendeu que a tecnologia já é um fato consumado e que pode ser utilizada de maneiras novas”.
A justaposição de uma campanha de fonte aberta, feita em rede, e de um cargo historicamente imperial terá implicações profundas. A partir de agora, lobistas e grupos de interesses especiais terão que encarar um ambiente de transparência e um presidente que não lhes deve nada.
A mídia terá que lidar com um governo capaz de falar diretamente a sua base, sem o intermédio das redes de televisão.
E, embora muitas pessoas considerem Obama uma dádiva para o Partido Democrata, é possível que ele acabe, na realidade, por apressar seu fim. Os partidos políticos fornecem uma marca, trabalhadores de campanha, dinheiro e relacionamentos —coisas que Obama já tem.
Todos os partidários do presidente eleito que trocaram seus dados pessoais por um ingresso para um comício ou a informação adiantada, feita por e-mail, do nome escolhido para candidato a vice, ou então que se cadastraram na campanha no Facebook ou em MyBarackObama, podem agora ser destinatários de e-mails em massa enviados a um custo quase zero. E, em lugar das constantes pesquisas de opinião que vinham sendo uma ferramenta padronizada da governança presidencial, a Casa Branca de Obama poderá usar a internet para medir as reações dos eleitores.
A conversa que Obama manteve com o eleitorado ao longo de 20 meses vai agora ingressar numa fase nova.
Entre as pessoas que trabalharam para elegê-lo, existe um sentimento de serem participantes do processo.
“As pessoas vão continuar a esperar uma conversa, uma relação de mão dupla em que se dá e se recebe”, disse Thomas Gensemer, sócio-gerente da Blue State Digital, que ajudou a conceber o programa de comunicação digital de Obama.
“Qualquer político que deixe de reconhecer que estamos vivendo numa era pós-partidária dotada de uma nova ecologia política, em que interconectar cabeças que pensam de maneira semelhante e formar um movimento se tornou muito mais fácil, não vai sobreviver por muito tempo”, disse Andrew Rasiej, fundador do Fórum de Democracia Pessoal, uma conferência anual sobre a intersecção entre política e tecnologia.
“Sim, encontramos o Grande Irmão, aquele que está sempre vigiando. E o Grande Irmão somos nós mesmos.”

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