São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 2008

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ANÁLISE

A Rússia, um desafio para próximo governo

Por HELENE COOPER

WASHINGTON - Nos poucos momentos em que tem falado da Rússia, a atenção de Barack Obama se concentra sobretudo na necessidade de manter armas nucleares soviéticas fora das mãos de terroristas.
Mas o presidente russo, Dmitri Medvedev, acaba de lançar um desafio ao líder eleito. No dia seguinte à eleição, enquanto líderes mundiais faziam fila para parabenizar Obama, Medvedev fez um discurso intransigente em Moscou, no estilo “bem-vindo à nova Guerra Fria”.
Medvedev disse que, se os EUA seguirem adiante com seus planos de construir um escudo antimísseis na Europa —que Obama declarou apoiar na campanha—, ele deslocará para perto da Polônia mísseis de curto alcance capazes de atingir território da Otan (aliança militar ocidental). E pôs Obama de sobreaviso com relação à crise na Geórgia, declarando que não “recuará” no Cáucaso.
“Foi um gigantesco ‘ei, bem-vindo ao jogo’”, comentou George Friedman, executivo-chefe da empresa de análise de riscos geopolíticos Stratfor. “Obama gostaria de tratar seqüencialmente do Iraque, do Afeganistão e então, quando tiver tempo, da Rússia, mas os russos querem estar no topo da lista de prioridades.”
Obama ainda não respondeu ao discurso agressivo russo e, segundo seus assessores, provavelmente não o fará antes de sua posse, em janeiro. “Temos apenas um presidente de cada vez”, disse o eleito à imprensa. “Quero certificar que estejamos enviando ao mundo uma só mensagem.”
Desde a eleição, a equipe de Obama faz questão de não dizer nada que possa revelar o pensamento do eleito sobre importantes questões de política externa. Há duas razões para isso. Muitos desses assessores esperam conseguir cargos administrativos e não querem prejudicar-se por falar demais. Mais importante ainda, o próprio Obama ainda está fazendo a transição entre o discurso de campanha —no caso da Rússia, um discurso contundente— para a abordagem mais sutil que, segundo assessores, será necessária para levar adiante relações contenciosas.
Mas algumas das declarações feitas durante a campanha podem já ter limitado suas opções. Quando a Rússia invadiu a Geórgia, em agosto, a resposta inicial de Obama foi moderada, exortando os dois países a usarem de contenção. Entretanto, sob pressão de seu adversário, John McCain, que reagiu com uma abordagem linha-dura, Obama endureceu sua posição. Ele acusou a Rússia de infringir a soberania da Geórgia, afirmou que a Rússia era responsável pela escalada e chegou a expressar apoio à entrada da Geórgia na Otan, uma posição que a Rússia praticamente desafiou o Ocidente a assumir.
Especialistas dizem que Obama tem opções para distanciar-se das duras observações que fez em relação à Rússia. Para começar, ao mesmo tempo em que pode continuar apoiando o ingresso da Geórgia na Otan, a realidade é que, por enquanto, os europeus não vão aderir à idéia.
Obama também pode tentar acordos que tranqüilizem os russos, como voltar a propor a entrada da Rússia na Organização Mundial do Comércio e trabalhar com Moscou para encontrar uma saída do atoleiro do escudo antimísseis. Uma possibilidade é propor adiar a construção do escudo na Polônia enquanto uma ameaça nuclear iraniana não se concretize de fato, em lugar de fazê-lo imediatamente.
O governo Bush pode até dar uma mão; ele já fez várias propostas a Moscou, incluindo a oferta de autorizar oficiais militares russos a inspecionar as instalações de defesa antimísseis planejadas para a Polônia e a República Tcheca.
O que Obama não poderá fazer, disseram especialistas, é deixar as ex-repúblicas soviéticas e os ex-satélites soviéticos na Europa oriental voltarem à órbita do que a Rússia chama de seu “exterior próximo”.
É uma pauta complexa e distante do primeiro contato de Obama com a política russa, quando ele acompanhou o Comitê de Relações Exteriores do Senado numa visita a Rússia, Ucrânia e Azerbaijão, em 2005, ao lado do senador Richard Lugar, o decano republicano na área de política externa. Na ocasião, Obama em vários momentos cedeu a palavra a Lugar. Estava claro, segundo as pessoas que acompanharam a viagem, quem era o velho mestre em política externa e quem era o senador novato.

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