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CLÓVIS ROSSI
Engano em massa
SÃO PAULO - A mídia britânica ficou alarmada com a decisão do juiz Hutton de inocentar o primeiro-ministro
Tony Blair e de culpar a BBC pelo
episódio em que a rede pública denunciou o governo por, supostamente, inflar o risco de o Iraque possuir
armas de destruição em massa.
A idéia predominante fica clara na
frase de Jeremy Dear, secretário-geral
do sindicato dos jornalistas:
"O relatório (do juiz Hutton) é
grosseiramente parcial e faz pesar
uma ameaça sobre o futuro do jornalismo de investigação".
Exagero à parte, fica difícil, de fato,
entender como o governo pôde ser
inocentado.
Vamos aos fatos. Fato um: o governo chegou a dizer que o Iraque, em 45
minutos, poderia ter disponíveis armas de destruição em massa.
Falso. Se pudesse, por que, então, se
rendeu tão facilmente?
Fato dois: depois de nove meses de
ocupação, nem norte-americanos
nem britânicos conseguiram descobrir uma única arma do gênero. Logo, só se pode concluir que houve um
baita exagero na argumentação de
ambos os governos.
É até possível que a reportagem específica da BBC tivesse defeitos técnicos, como não ouvir o governo ou
fiar-se apenas em uma fonte. De todo
modo, se a BBC errou no varejo, acertou no atacado: o governo exagerou a
ameaça iraquiana, ainda que o tenha feito de boa-fé.
É sintomático que, no mesmo momento em que o juiz britânico inocenta Blair e culpa a BBC, o especialista norte-americano David Kay tome rumo inverso: aponta a escassa
possibilidade de que o Iraque possuísse as tais armas.
Tudo somado, ainda vale o título
de capa da revista "The Economist"
de 4 de outubro: em vez de "weapons
of mass destruction" (armas de destruição em massa), a revista dizia,
sob as fotos de Blair e Bush, que eles
eram "wielders of mass deception"
(algo como "portadores de engano
em massa").
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