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OTAVIO FRIAS FILHO
Limites do império
Depois da guerra contra o Iraque,
que consumou o unilateralismo
dito preventivo da nova política externa americana, passou a ser comum a
impressão de que a ONU perdeu importância. Lamentou-se o golpe sofrido pelo Conselho de Segurança, apresentado em algumas análises como se
fosse representante do conjunto das
nações ou árbitro do bem e do mal.
Essas noções talvez devessem ser
mais bem focalizadas, para usar o jargão da moda. Afora o valioso trabalho
que as Nações Unidas desenvolvem
em áreas de cooperação humanitária,
seu papel estratégico sempre foi retórico, decorativo. A Assembléia Geral,
sua instância máxima, não tem poderes. A ONU não é uma democracia
nem foi concebida como tal.
Quando de sua gestação, logo após a
Segunda Guerra, evitou-se reincidir
nas fantasias bem-intencionadas que
anularam a Liga das Nações, o malfadado organismo que a precedeu nos
anos 20 e 30. Estabeleceu-se que na
ONU o poder de direito estaria reservado aos países que detinham o poder
de fato, os vitoriosos na guerra contra
o nazi-fascismo.
A esses países foi assegurada a condição de membros permanentes e
com direito de veto no Conselho de
Segurança, este sim um organismo
com poder real, desde que o clube vote
unido. Tal prerrogativa, conferida a
Estados Unidos, União Soviética, Inglaterra, França e China, foi facilitada
pela ampla aprovação política e moral
que cercava sua recente vitória.
Ao longo dos anos seguintes, o poder do Conselho de Segurança foi reforçado pelo fato de que seus membros passavam a ser também os únicos sócios de outro clube, o dos países
dotados de armas nucleares. Mesmo
assim, o Conselho revelou-se muito
pouco operante. Os aliados da Segunda Guerra logo formaram dois blocos
antagônicos que se vetavam mutuamente.
Na prática, o Conselho de Segurança
funciona em casos periféricos, nas raras ocasiões em que nenhuma das potências tem compromissos num conflito específico e em que todas se colocam, por isso mesmo, de acordo. Nos
casos relevantes, cada potência vem
agindo de acordo com seus interesses
sem que o Conselho possa coibi-la,
paralisado pelo direito de veto.
Feitas essas ressalvas, porém, talvez
seja precipitado tocar um réquiem pelo Conselho e pela ONU. Apreensivas
com o agressivo desembaraço da política norte-americana, relegadas a uma
posição secundária do ângulo militar,
as demais potências tenderão a fortalecer o recurso às instâncias multilaterais de diplomacia e negociação.
Mas não seria essa a fonte de um
eventual renascimento do CS. A insistência dos Estados Unidos em obter
seu respaldo mostra que até mesmo a
atitude imperial busca legitimação no
mundo contemporâneo. É a opinião
pública internacional, mais informada e menos disposta a tolerar guerras,
quem pode impor freios à superpotência e manter vivo o ideal da ONU.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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