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São Paulo, quinta-feira, 01 de maio de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Participação e luta por emprego e salário

JOÃO FELICIO

Passados 20 anos de sua criação, a CUT e os brasileiros vivem um 1º de Maio muito especial. Temos à frente da nossa nação, pela primeira vez, um presidente oriundo das classes trabalhadoras. Com ações descentralizadas em nove locais diferentes da Grande São Paulo e do ABC paulista, a CUT no dia de hoje tem muito a comemorar. É a quinta maior central sindical do mundo, a maior da América Latina e congrega 3.319 sindicatos brasileiros e representa 21 milhões de trabalhadores.
O formato das comemorações é o mesmo do ano passado, quando fomos às periferias falar não exclusivamente com sindicalistas, mas com a população em geral, uma maioria que nem sempre conhece a CUT ou a importância dos movimentos populares para a classe trabalhadora. A programação cultural e política inclui o relato do andamento das reformas da Previdência, tributária, sindical e trabalhista, agrária e de governo e a participação da CUT nas discussões. É um momento privilegiado para lembrarmos as lutas dos trabalhadores no mundo em todos os tempos e para reafirmarmos a nossa determinação em participar desse momento tão rico da história política nacional, em que as expectativas e os problemas a serem enfrentados são muitos e complexos.
Temos participado com prazer de todos os fóruns propostos pelo atual governo para discutir questões relativas à vida dos trabalhadores e da população. Nunca, nestes 20 anos de existência, tivemos um interlocutor que nos respeitasse e reconhecesse a nossa importância. Com o presidente Lula, essa possibilidade é real. A palavra negociação passou a ter um novo significado, mais sério e profundo, para debater e apontar soluções para acabar com mazelas que envergonham o país, como trabalho infantil e escravo, preconceito racial e de gênero, baixa formação educacional e profissional, falta de moradia e de terras; sem falar da falta de emprego, de liberdade e autonomia sindical.


Defendemos uma Previdência Social pública num sistema único e universal e um teto de 20 salários


Queremos estar juntos para avançarmos na democratização do Estado brasileiro, e a negociação é o pressuposto básico da democracia participativa. Além do desejo de participação política, permanecem atuais as lutas por emprego, salários, distribuição de renda e garantia de direitos. Os desafios são muitos. O exercício da autonomia em relação ao governo Lula é uma experiência nova e, talvez, o maior desses desafios para os cutistas. Estamos enfrentando essa nova situação sem comprometer nossa autonomia e com a responsabilidade de ter ajudado a eleger Lula.
O país precisa de reformas para avançar com distribuição de renda e justiça social. É visível a herança econômica de governos anteriores no que se refere ao mercado de trabalho e à situação geral dos trabalhadores. Dados do Seade/ Dieese revelam que a taxa média de desemprego de dezembro de 2002, nas principais regiões metropolitanas brasileiras, ficou bem acima do início do Plano Real, em 1994.
Nesse ponto, nós solidarizamos com os trabalhadores do resto do mundo. Segundo a OIT, existe, em todo o mundo, 1 bilhão de desempregados. Nos países do Mercosul esse índice está em torno de 19%. Nas duas regiões que melhores salários pagam no Brasil e na Argentina -Grande São Paulo e Grande Buenos Aires-, metade dos assalariados ganha até U$ 120.
É importante lembrar que o alto desemprego também se deve às práticas de utilização da mão-de-obra. Em 2002, quase 29 milhões de trabalhadores -40% do total de ocupados- realizavam jornadas superiores ao teto constitucional, de 44 horas. Isso quer dizer que uma reforma trabalhista que contemple a redução da jornada de trabalho e promova o controle do uso de horas extras, como a CUT defende, poderá contribuir para uma queda significativa do desemprego.
Sobre a reforma da Previdência, que defendemos desde 1995, ela deve buscar incluir os 55% da população totalmente excluídos. Defendemos uma Previdência Social pública num sistema único e universal e um teto de 20 salários, que cobre cerca de 95% dos trabalhadores da área privada e cerca de 90% dos da área pública.
Porém, na proposta enviada ao Congresso ontem pelo governo, há pontos dos quais a CUT discorda veementemente. Somos contra a taxação de um inativo que ganhe R$ 1.058; não aceitamos a elevação de idade de forma linear, porque acaba prejudicando o mais pobre, que entra no mercado de trabalho mais cedo e terá que contribuir por mais de 40 anos com a Previdência. Também não há nenhuma garantia de que, no setor público, os aposentados terão reajustes de acordo com a inflação. Vamos nos mobilizar para que esses pontos da reforma não sejam aprovados.
Queremos uma reforma tributária que desonere a produção e que diminua a carga tributária das pequenas e médias empresas; propomos a criação de mais alíquotas, diminuindo o Imposto de Renda pago pela classe média mais pobre, e reivindicamos o imposto sobre heranças e latifúndios improdutivos. Muitas dessas propostas já estão contempladas nas do governo.
No âmbito da reforma trabalhista, a CUT propõe alterações importantes na CLT, todas baseadas na ampliação do atual patamar de direitos já assegurados. É necessário um novo código trabalhista para o país.
Mais do que uma legislação sobre direitos mínimos, o equilíbrio nas relações de trabalho requer a existência de sindicatos livres, autônomos, representativos e independentes, por isso a necessidade da legalização imediata das centrais sindicais e a implementação dos contratos coletivos nacionais e a organização por local de trabalho.
A CUT também defende a redução da jornada de trabalho sem redução de salários e benefícios e a limitação das horas extras, bem como a efetiva fiscalização e coibição do trabalho escravo e degradante e do trabalho infantil. No entanto sabemos que só haverá emprego digno e salário decente com crescimento econômico, e esse é o grande desejo da classe trabalhadora.

João Antonio Felicio, 52, professor, é presidente nacional da CUT (Central Única dos Trabalhadores).


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