São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Distribuindo culpas

SÃO PAULO - Convenhamos que houve uma certa maldade no tratamento que a maioria dos jornais deu à queda da renda no ano passado, apontando-a como uma marca do primeiro ano da era Lula.
É até factualmente verdade, mas é apenas a sétima parte da verdade. Explico: a renda vem caindo desde 1996, ou seja, a rigor, desde o início de outra era, a era tucana. Conforme mostrou tabela publicada por esta Folha, o trabalhador perdeu, na média, praticamente 19% de seu rendimento de 1996 a 2003.
Não é que a renda tenha oscilado, não, senhor. Caiu ano após ano. O pecado de Lula, portanto, não é o de ter inventado a redução da renda do assalariado, mas o de ter mantido uma tendência que vinha da gestão anterior, embora, já na posse, tivesse prometido "mudança".
Pode-se até alegar, em defesa do governo, que não havia como operar uma mudança, no quesito renda, nas circunstâncias em que Lula assumiu. Dá uma boa discussão, mas, agora, é inútil voltar ao assunto.
Contra o governo, pode-se também dizer que a sua cota no latifúndio da desgraça do assalariado está dada pelo fato de que manteve, na essência, a política macroeconômica anterior. Logo, se esta fez a renda baixar ano após ano, sua continuidade só poderia causar nova queda.
Mas também não é bem assim. Políticas parecidas podem produzir resultados diferentes, dependendo das circunstâncias internas e externas em que são implementadas. No caso da renda, está havendo, neste ano, uma leve recuperação, o que poderá levar os jornais a dizer, em 2005, que a marca do segundo ano Lula foi a recuperação da renda.
Será verdade, mas, de novo, será parte da verdade. O fato central é que a renda do assalariado brasileiro é escandalosamente baixa, tanto no governo Lula como no anterior e nos anteriores dos anteriores, e nada aponta para uma mudança significativa nesse quesito.


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