|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CLAUDIA ANTUNES
A novidade
RIO DE JANEIRO - Aqui e ali vão surgindo sinais de desconforto com o assédio a Lula e com a relação calorosa
do presidente eleito com a população
-fato tão inédito na história brasileira pós-redemocratização que é como se, de fato, a campanha eleitoral
não tivesse terminado.
Alguns recomendam diretamente
ao petista que desça das nuvens e
caia na realidade. Outros, em uma
advertência mal dissimulada, destacam as cobranças. Os eleitores, dizem, agora pedem o milagre: a casa,
o emprego. Se em Brasília houve recepção nas ruas ao presidente eleito,
é porque, conclui-se, os funcionários
públicos esperam aumento imediato.
Uma parte do estranhamento deve-se, claro, ao contraste. Fernando
Henrique pertence a uma parcela da
intelectualidade que se vacinou tão
fortemente contra o populismo que
passou a tomar como tal qualquer
contato mais afetuoso com a população, a não ser no obrigatório corpo-a-corpo eleitoral. Mesmo nesses casos, o
presidente parecia inconvincente, um
peixe fora da água.
Outro motivo do desconforto é o
medo, reforçado pelo preconceito.
Não só porque há quem tema o papel
que a entidade "povo" possa vir a desempenhar no governo Lula, caso ele
cultive sua relação direta com as
massas, como porque não se sabe
quais são realmente as expectativas
do seu eleitorado.
A campanha de rua mereceu pouca
atenção da imprensa, com a prioridade que foi dada ao horário oficial
na TV, aos bastidores, às pressões do
mercado. No máximo, foram ouvidos
líderes de movimentos sociais. No entanto a mesma comoção que agora
causa espanto foi a marca das viagens de Lula, segundo relata o cineasta João Moreira Salles.
Salles, que faz um filme sobre a eleição do petista, conta ter visto multidões eletrizadas. Será que as pessoas
estavam lá por causa do Zezé di Camargo? O que elas esperam? Quanto
de racionalidade e de emoção teve
seu voto? Há um pacto de identificação e de confiança entre elas e o presidente eleito, ou é uma onda que vai
se desfazer em três meses? Ainda é
preciso entender a novidade.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: O filé para Lula, o osso para o PT Próximo Texto: José Sarney: Que país é este? Índice
|