São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2004

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MAIS UM MOTIM

A rebelião na casa de custódia de Benfica, no Rio de Janeiro, não pode ser considerada uma surpresa. Apesar das dezenas de mortos e da barbárie que o caracterizaram, o motim no presídio carioca é apenas mais um episódio da deterioração do sistema prisional brasileiro e do preocupante aumento da violência urbana no país.
Ainda há pouco, a sociedade assistiu ao dramático sítio da favela carioca da Rocinha, em meio a disputa entre bandos rivais de traficantes, e ao sangrento motim na casa de detenção José Mário Alves, em Rondônia, também conhecida como Urso Branco. Episódios alarmantes como esses compõem um cenário de crise que tem múltiplas facetas e causas.
O aumento da violência e a falência do sistema carcerário não podem ser dissociados da ascensão do crime organizado e do narcotráfico. Organizações como essas, por sua vez, beneficiam-se da atuação ineficiente de forças policiais, em geral desaparelhadas, despreparadas, mal pagas e -em muitos casos- contaminadas pela corrupção.
Esse quadro nefasto não estaria completo sem menção à morosidade da Justiça, que, devido à própria legislação, acaba muitas vezes por condenar infratores à reclusão por delitos passíveis de penas alternativas, contribuindo para a superlotação dos presídios. São problemas para os quais a reforma do Poder Judiciário, atualmente em discussão no Congresso Nacional, poderia trazer ao menos soluções parciais.
Diante da complexidade do cenário, é forçoso concordar com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, quando ele afirma que "soluções mágicas" não resolverão a crise da segurança pública. Contudo isso não exime o poder público de suas responsabilidades. No caso específico do sistema prisional, o governo federal continua devendo a implementação das medidas propostas no plano de segurança publica do PT divulgado por ocasião da campanha presidencial de 2002. Dos cinco novos presídios prometidos no início do ano passado, nenhum foi concluído, sendo que apenas um edital para construção foi publicado.
O caldo de cultura da violência é a prolongada crise socioeconômica. Ninguém duvida de que a falta de perspectiva decorrente do desemprego, a precariedade do sistema educacional público e as profundas desigualdades sociais contribuem para a escalada do crime. É evidente que o combate à criminalidade e à violência exige ações específicas e coordenadas entre as diversas esferas do poder público, mas só será bem-sucedido se for acompanhado pelo enfrentamento de suas causas sociais.


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