|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Novela macabra
SÃO PAULO - O "silêncio sorridente de São Paulo diante da chacina", tratado com ironia e horror por Caetano
Veloso na letra de "Haiti", referindo-se ao massacre da Casa de Detenção,
foi quebrado por uma onda de indignação, da qual a própria canção fez
parte. O tema Carandiru entrou no
imaginário nacional e inspirou, ainda no campo da cultura, uma potente instalação do artista plástico Nuno
Ramos, em 1993, e, mais recentemente, o filme de Hector Babenco, baseado em livro de Drauzio Varella, e o
documentário "O Prisioneiro da Grade de Ferro", de Paulo Sacramento.
No âmbito político, o episódio mereceu condenação nacional e internacional, foi execrado pela elite pensante e acabou gerando considerável
desgaste para o governador Luiz Antonio Fleury.
Do ponto de vista prático, no entanto, o massacre do Carandiru pouco produziu -talvez um pouco mais
de cautela dos governantes na hora
de ordenar a invasão de penitenciárias rebeladas. Destruiu-se a Casa de
Detenção e houve algum investimento do poder público paulista em novos presídios. Já o coronel Ubiratan,
que comandou a operação, foi eleito
deputado estadual. E as rebeliões
prosseguiram pelo país afora, demonstrando que a situação continua
insustentável.
Verdadeiros depósitos onde se acotovelam infratores de todas as espécies, os presídios brasileiros são uma
versão terceiro-mundista do inferno.
A população, assustada com a criminalidade, pouco parece se importar.
Se matassem todos, para muitos talvez fosse mesmo melhor.
A carnificina na casa de custódia
de Benfica, no Rio, que se seguiu à
barbárie do presídio Urso Branco, em
Rondônia, é apenas um novo capítulo dessa novela macabra. Outros ainda virão. Entidades de direitos humanos irão protestar, as autoridades
de plantão dirão que a crise não se resolve de uma hora para outra, governantes tentarão acobertar sua inoperância e o sistema continuará falido
de qualquer ângulo que se queira observá-lo -do moral ao financeiro.
Texto Anterior: Editoriais: MAIS UM MOTIM Próximo Texto: Brasília - Fernando Rodrigues: Cizânia no Planalto Índice
|