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TRAGÉDIA EM BAGDÁ
É muito possível que nunca
se descubra ao certo a causa do
tumulto de anteontem em Bagdá que
resultou na morte de cerca de mil
pessoas que participavam de um festival religioso xiita. Há relatos de que
o pânico foi deflagrado pelo boato de
que havia um homem-bomba prestes a explodir-se nas imediações.
A versão é verossímil e corroborada
pelo fato de que a insurgência (majoritariamente sunita) costuma mesmo lançar ataques contra alvos xiitas, o que tornava crível o rumor. Deve-se recordar, porém, que tragédias
análogas já ocorreram sem razão
aparente, como foi o caso do corre-corre que, em 1990, matou 1.400 fiéis
que participavam do "hajj", a peregrinação a Meca (Arábia Saudita).
Como catástrofes dessa magnitude
sempre exigem que se encontrem
"culpados", lideranças xiitas já acusam sunitas de ter deliberadamente
espalhado o boato do homem-bomba, numa atitude que contribui para
aumentar ainda mais a tensão entre
os dois grupos religiosos.
Divergências entre xiitas e sunitas
-e também curdos- estão na origem do atual impasse constitucional. O esboço de Carta redigido por
uma comissão parlamentar atende a
pleitos de xiitas, que correspondem a
60% da população, e curdos, que
perfazem 20% dos iraquianos, e praticamente exclui as demandas de sunitas. Embora esse grupo responda
por outros 20% da população, ele ficou sub-representado na Assembléia
Nacional, pois houve boicote eleitoral nas regiões sunitas.
A Constituição deverá ir a consulta
popular em outubro e será rejeitada
se pelo menos duas províncias recusarem o texto. Os sunitas controlam
três regiões, o que basta para assegurar-lhes o direito de veto. Mesmo que
não tivessem tal poder de fogo, qualquer acordo político que vise pôr um
fim à situação de guerra civil precisa
incluir esse grupo, que é, afinal, o
grande foco da resistência.
Fruto do acaso ou sordidamente
maquinada, a tragédia de anteontem
em Bagdá favorece bastante os que
apostam no caos e numa eventual
fragmentação do Iraque.
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