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Só falta a costeleta
CLÓVIS ROSSI
São Paulo - Difícil dizer se dá mais
raiva ou pena a leitura do discurso e
da entrevista coletiva de anteontem
do presidente Fernando Henrique
Cardoso.
Pelo menos na televisão, ficou patético o som daquela risada, ao fundo,
quando o presidente entronizava a
dentadura como novo símbolo do Plano Real. Tão patético que o presidente
sentiu-se obrigado a dizer: "Isso não é
para rir".
Quando um presidente da República
precisa explicar que uma observação
sua não é piada, é um mau sinal. Sinal
de que os fatos (ou observações) já não
se impõem por si. É preciso explicar a
piada (ou a observação).
O pior é que a Folha levanta a dúvida sobre a seriedade da dentadura como prova de êxito do Real. Os responsáveis por elas dizem que não houve o
aumento no, digamos, consumo de
dentaduras apregoado pelo presidente.
O que permite até imaginar que algum bajulador de plantão deve ter dito a FHC: "Presidente, a tia da minha
empregada conseguiu colocar uma
dentadura nova, graças ao Plano
Real". E o presidente tomou o dado
como demonstração de que todos os
pobres do país viram, graças a ele,
abrir-se a chance de cuidar dos dentes.
Todo o resto da entrevista mereceria
explicações idênticas às que FHC teve
que usar sobre a dentadura. Exemplo:
a menção ao fato de que não há saídas
mágicas, tiradas da "batina", para a
área social.
É até verdade, mas não dá para esquecer que FHC, como líder do Cebrap, participou de um estudo, 22
anos atrás, chamado "São Paulo-Crescimento e Pobreza", em que
fórmulas sociais eram, sim, tiradas da
"batina" (o estudo foi feito sob encomenda da Arquidiocese de São Paulo).
O fato é que FHC está cada dia mais
parecido, no discurso, com o presidente argentino Carlos Menem, que não é
exatamente um campeão de argumentos consistentes.
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