São Paulo, quarta, 3 de setembro de 1997.



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Só falta a costeleta

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Difícil dizer se dá mais raiva ou pena a leitura do discurso e da entrevista coletiva de anteontem do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Pelo menos na televisão, ficou patético o som daquela risada, ao fundo, quando o presidente entronizava a dentadura como novo símbolo do Plano Real. Tão patético que o presidente sentiu-se obrigado a dizer: "Isso não é para rir".
Quando um presidente da República precisa explicar que uma observação sua não é piada, é um mau sinal. Sinal de que os fatos (ou observações) já não se impõem por si. É preciso explicar a piada (ou a observação).
O pior é que a Folha levanta a dúvida sobre a seriedade da dentadura como prova de êxito do Real. Os responsáveis por elas dizem que não houve o aumento no, digamos, consumo de dentaduras apregoado pelo presidente.
O que permite até imaginar que algum bajulador de plantão deve ter dito a FHC: "Presidente, a tia da minha empregada conseguiu colocar uma dentadura nova, graças ao Plano Real". E o presidente tomou o dado como demonstração de que todos os pobres do país viram, graças a ele, abrir-se a chance de cuidar dos dentes.
Todo o resto da entrevista mereceria explicações idênticas às que FHC teve que usar sobre a dentadura. Exemplo: a menção ao fato de que não há saídas mágicas, tiradas da "batina", para a área social.
É até verdade, mas não dá para esquecer que FHC, como líder do Cebrap, participou de um estudo, 22 anos atrás, chamado "São Paulo-Crescimento e Pobreza", em que fórmulas sociais eram, sim, tiradas da "batina" (o estudo foi feito sob encomenda da Arquidiocese de São Paulo).
O fato é que FHC está cada dia mais parecido, no discurso, com o presidente argentino Carlos Menem, que não é exatamente um campeão de argumentos consistentes.





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