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CLAUDIA ANTUNES
O ufanismo e seu contrário
RIO DE JANEIRO - É um exercício inútil, mas tentador, de delírio histórico: se o projeto de criação da Petrobras estivesse sendo discutido hoje, 50
anos depois, ele seria arquivado pelos
financistas que seguram as rédeas do
país, por antieconômico e megalomaníaco.
A própria idéia de fundação de
uma estatal monopolista é impensável nos tempos atuais e a hipótese de
investir dinheiro público num negócio de longo prazo e de risco nem sequer entraria em cogitação.
O fato de que a Petrobras, com seus
lucros enormes, venha contribuindo
para uma das poucas metas nacionais levadas a sério -a de economizar para pagar juros da dívida-
apenas acentua a ironia de a empresa ter sido construída sobre a "vontade política", que se pretende enterrar
no caixão do desenvolvimentismo.
A marca dos primeiros anos da estatal foi o voluntarismo. Em 1960,
quando o país importava quase todo
o combustível que consumia, um relatório assinado pelo geólogo americano Walter Link sentenciou que era
um desperdício procurar petróleo em
terra e viu com ceticismo, por causa
dos meios técnicos da época, a possibilidade de encontrá-lo no mar.
Link foi alvo dos nacionalistas, acusado -injustamente, dizem- de ser
"agente do imperialismo". A campanha levou à reformulação do seu relatório e, sem nenhuma base técnica,
decidiu-se que a busca continuaria.
Oito anos mais tarde, ela chegaria a
outro momento decisivo, quando se
optou por manter a exploração do
primeiro poço encontrado na plataforma continental apesar do custo de
separar o óleo da areia. Só agora,
meio século depois, a auto-suficiência está perto de ser alcançada.
Tudo isso é ufanista, como eram as
décadas em que se pensava que o destino estava à mão no "país do futuro". Hoje, vemos o passado pelo prisma dos problemas que herdamos -a
má distribuição de renda, o clientelismo. Mas, conformados à mediocridade, mergulhamos no "imobilismo
crônico", como diagnosticou há poucos dias o veterano Celso Furtado.
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