São Paulo, segunda-feira, 03 de outubro de 2011

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Mulheres e carros

É "para o próprio bem das mulheres". Com esse comentário, retrógrado e paternalista, uma autoridade religiosa da Arábia Saudita celebrou a condenação de Shaima Jastaina, mulher de cerca de 30 anos, a dez chibatadas.
O crime de Shaima Jastaina, pelo entendimento dos tribunais locais, consistiu em dirigir um carro.
A chamada "Primavera Árabe", que vai abalando o autoritarismo endêmico na região, custa a chegar ao país saudita, que desfruta de excelentes relações com as democracias ocidentais, sendo também o maior exportador de petróleo do mundo.
Embora mal distribuídos, os recursos obtidos com essa abundante riqueza mineral certamente propiciam meios de sustentação política para uma monarquia absolutista que, mal e mal, acena com algumas mudanças.
O próprio rei Abdullah depois cancelou a condenação de Shaima Jastaina. Dias antes, ele havia anunciado que, a partir de 2015, será permitida a participação de mulheres nas eleições municipais. Observe-se que, há duas décadas, o monarca saudita declarara vislumbrar o dia em que mulheres seriam autorizadas a dirigir.
As sauditas cansaram-se de esperar -e postaram, na internet, vídeos de si mesmas ao volante. Outros julgamentos estão marcados para casos semelhantes aos de Shaima Jastaina -cujo marido, aliás, já esclareceu apoiá-la integralmente.
Com alguma ironia, pode-se dizer que nem o marido manda nessa questão, entregue ao arbítrio das "fatwas" emitidas por clérigos medievais.
O possível acúmulo de protestos causado pela repetição de casos do mesmo tipo, em meio ao clima de transformações que atravessa o mundo árabe, talvez permita o fim desse interdito ridículo e dessa desumana forma de punição.
Um pouco de fantasia crítica poderia, de qualquer modo, sugerir aos clérigos métodos mais construtivos de inibir a reivindicação das sauditas. Delibere-se, por exemplo, a desapropriação de seus carros.
Poderiam ser exportados para outro país, igualmente famoso por seu atraso e autoritarismo.
Trata-se de Cuba, onde -pela primeira vez em 50 anos- resolveu-se permitir o comércio de automóveis.
Carros novos, mediante autorização do governo, poderão ser adquiridos de cinco em cinco anos. Como na Arábia Saudita, Cuba vai anunciando suas mínimas iniciativas liberalizantes. Seria o caso, entretanto, de pisar um pouco mais no acelerador.


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