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RUY CASTRO
Legados de amor e beleza
RIO DE JANEIRO - Sambista,
quando morre, vira samba, disse
Chico Buarque. Mas, e quando
morre um carnavalesco no Carnaval ou às vésperas? Ary Barroso
morreu no domingo de Carnaval de
1964. Em 1930, sua marchinha "Dá
Nela", cantada por Francisco Alves,
ajudara a fixar o gênero. E seu samba "Camisa Amarela", de 1939, já
nasceu como a crônica mais que
perfeita do tríduo. A morte de Ary
foi anunciada no instante em que o
Império Serrano ia adentrar a Presidente Vargas com "Aquarela Brasileira", de Silas de Oliveira.
Nove dias depois de Ary, morreu
Vicente Paiva. O nome de Vicente
talvez já não diga muito para os infiéis, mas o Brasil o conhece por
uma marcha de 1935 (com Nelson
Barbosa) cantada todo ano, até hoje, por milhares nas ruas do Rio:
"Quem não chora não mama/ Segura, meu bem, a chupeta/ Lugar
quente é na cama/ Ou então no Bola
Preta". E o território de seu outro
sucesso, de 1937 (este, com Jararaca), cobre simplesmente o mundo:
"Mamãe, Eu Quero".
Benedito Lacerda também morreu no Carnaval, o de 1958. Entre
tanta coisa que deixou, foi o autor
(com Humberto Porto) da "Jardineira", em 1939. E Paulo da Portela,
a quem as escolas devem a pose e o
garbo, morreu no domingo anterior
ao Carnaval de 1949. Uma multidão
o levou ao cemitério de Irajá e, no
bicho daquele dia, deu a centena do
seu túmulo: 2.908.
Mas nada supera em simbolismo
a morte de Pixinguinha: em 1973,
de repente, numa igreja em Ipanema, enquanto a poucos metros, sob
chuva forte, saía a própria Banda de
Ipanema. Na rua, alguém levou a
notícia a Albino Pinheiro. A Banda
cantou "Carinhoso" e chorou Pixinguinha de corpo presente.
O acaso ajudou, mas todo o confete e o amor do mundo não pagam o
que esses homens nos legaram em
alegria e beleza.
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