São Paulo, sexta-feira, 04 de abril de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O sucateamento da ciência brasileira
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE
3. Foi suprimida a Secretaria de Política de Informática, área de produção industrial à qual foram concedidos expressivos subsídios e que necessita permanentemente de regulamentação e controle, pois é um campo em que a evolução tecnológica produz novas aplicações a cada dia. É claro que o empresário do setor prefere agir sem restrição e deve estar exultante; 4. Outra secretaria extinta foi a que se ocupava das unidades de pesquisa, ou seja, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, das organizações sociais e dos institutos; ao todo quase 20 instituições. Essa hipercentralização só pode servir ao caos e ao casuísmo; 5. Não tiveram coragem de extinguir completamente o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, mas reduziram, ilegalmente, seu orçamento a 7% do que fora orçado e aprovado no Congresso Nacional. Esse órgão tinha como missão a realização de estudos que permitissem ao MCT elaborar suas políticas e se informar para tomadas de decisão, o que se tornara imprescindível com a criação dos fundos setoriais, que constituem o principal apoio financeiro à pesquisa aplicada no Brasil. Com a eliminação em futuro próximo do centro, as decisões virão a ser tomadas sem apoio técnico, o que, desconfiamos, será bastante conveniente para atuação política; 6. Enquanto em países desenvolvidos a pesquisa em nanotecnologia já absorve cerca de US$ 5 bilhões por ano, o Brasil dá o seu primeiro e hesitante passo reservando R$ 8 milhões para iniciar um instituto especializado nesse campo. A expectativa é que a revolução nanotecnológica vá gerar um mercado de US$ 1 trilhão por ano já na próxima década. Pois bem, o projeto de elaboração de um Programa Nacional de Nanotecnologia, que levou dois anos para ser elaborado, teve seu orçamento zerado, apesar de aprovado no Congresso Nacional e sancionado pela Presidência. O objetivo principal desse programa era possibilitar ao país conquistar para suas empresas uma fatia significativa do mercado mundial que se projeta para a nanotecnologia, em linha com uma política de aumento do conteúdo tecnológico e do valor da pauta de exportações dos produtos brasileiros. A decisão de zerar esse projeto baseou-se na desculpa de que será criada uma "rede" de nanotecnologia. Ora, qualquer iniciado sabe que sem um centro de coordenação, uma concentração mínima, uma massa crítica, não há possibilidade de sucesso em atividades de pesquisa e desenvolvimento em áreas sujeitas à intensa competição internacional. Redes de organismos independentes de pequeno porte, espalhadas democraticamente pelo Brasil, só conseguiriam uma atuação eficiente se ancoradas em uma instituição com massa crítica. É preciso primeiro criá-la e, então, atrelar a ela as redes. A solução proposta serve, porém, aos propósitos populistas do MCT, pois o dinheiro assim distribuído fará muita gente modesta satisfeita. Pois bem, o MCT, desde sua criação, nunca fora objeto de troca no tabuleiro da política partidária. É lastimável que justamente na ascensão do PT, que tanto alardeia sua convicção de que o conhecimento é a base do desenvolvimento econômico, torne-se o Ministério da Ciência e Tecnologia palco de populismo desagregador e do mais retrógrado jogo politiqueiro. Rogério Cezar de Cerqueira Leite, 71, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Editorial da Folha. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Luiz Eduardo Soares: Repactuando a segurança pública Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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