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CLÓVIS ROSSI
O boné e a guerra
SÃO PAULO - Uma coisa é condenar, veementemente, a radicalização e as
ilegalidades praticadas por setores do
MST e, outra, criminalizar o movimento social em si e o presidente da
República pelo episódio do boné.
O senador Jorge Bornhausen (SC),
presidente nacional do PFL, lembrou
bem, em seu artigo de ontem, que
Luiz Inácio Lula da Silva "não chegou ao poder levado por barricadas,
invasões ou desordens, mas pelo voto
legítimo da sociedade".
Pena que esqueceu de lembrar que
Lula tem, desde SEMPRE, vínculos
com o MST; que o eleitorado não poderia ignorar tais vínculos; e que, não
obstante, concedeu ao hoje presidente seu "voto legítimo".
Se havia tal vínculo, é uma questão
de coerência mantê-lo depois de eleito. Criticável é o presidente ser incoerente em outras posições históricas
agora abandonadas.
O senador esqueceu também de
lembrar que Fernando Henrique
Cardoso, do qual foi aliado o tempo
todo, recebeu, não uma, mas duas vezes, a liderança do MST, e nem por isso foi condenado por Bornhausen
(não usou boné, é verdade; mas é isso
que faz toda a diferença?).
A violência no campo é de fato lamentável, mas entre criticá-la e distorcer os fatos vai uma distância que
nem a paixão deve encurtar.
Bornhausen, em seu artigo, diz que
o MST "ameaça provocar uma nova
guerra de Canudos".
Ainda que se aceite o monumental
exagero, convém, em benefício dos
fatos, lembrar que qualquer estatística básica dos conflitos no campo vai
mostrar que o maior número de vítimas é, de longe, de muito longe, composto por sem-terra, na guerra de Canudos como agora.
O MST tem mesmo que decidir entre ser um movimento a favor da reforma agrária, o que é legítimo, e ser
um grupo revolucionário, o que é no
mínimo anacrônico. Mas, mesmo enquanto oscila entre uma coisa e outra
coisa, é preciso colocar um mínimo
da perspectiva na análise.
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