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São Paulo, sexta-feira, 04 de julho de 2003

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CLÓVIS ROSSI

O boné e a guerra

SÃO PAULO - Uma coisa é condenar, veementemente, a radicalização e as ilegalidades praticadas por setores do MST e, outra, criminalizar o movimento social em si e o presidente da República pelo episódio do boné.
O senador Jorge Bornhausen (SC), presidente nacional do PFL, lembrou bem, em seu artigo de ontem, que Luiz Inácio Lula da Silva "não chegou ao poder levado por barricadas, invasões ou desordens, mas pelo voto legítimo da sociedade".
Pena que esqueceu de lembrar que Lula tem, desde SEMPRE, vínculos com o MST; que o eleitorado não poderia ignorar tais vínculos; e que, não obstante, concedeu ao hoje presidente seu "voto legítimo".
Se havia tal vínculo, é uma questão de coerência mantê-lo depois de eleito. Criticável é o presidente ser incoerente em outras posições históricas agora abandonadas.
O senador esqueceu também de lembrar que Fernando Henrique Cardoso, do qual foi aliado o tempo todo, recebeu, não uma, mas duas vezes, a liderança do MST, e nem por isso foi condenado por Bornhausen (não usou boné, é verdade; mas é isso que faz toda a diferença?).
A violência no campo é de fato lamentável, mas entre criticá-la e distorcer os fatos vai uma distância que nem a paixão deve encurtar.
Bornhausen, em seu artigo, diz que o MST "ameaça provocar uma nova guerra de Canudos".
Ainda que se aceite o monumental exagero, convém, em benefício dos fatos, lembrar que qualquer estatística básica dos conflitos no campo vai mostrar que o maior número de vítimas é, de longe, de muito longe, composto por sem-terra, na guerra de Canudos como agora.
O MST tem mesmo que decidir entre ser um movimento a favor da reforma agrária, o que é legítimo, e ser um grupo revolucionário, o que é no mínimo anacrônico. Mas, mesmo enquanto oscila entre uma coisa e outra coisa, é preciso colocar um mínimo da perspectiva na análise.


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