São Paulo, segunda-feira, 05 de agosto de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Cinco de agosto

RIO DE JANEIRO - Em 1954, no 5 de agosto, o major Vaz morria num atentado aqui no Rio, e sua morte provocaria, 19 dias depois, o suicídio do presidente Vargas.
Por que estou lembrando um fato pré-histórico, do tempo das cavernas da memória? Tendência mórbida à hora da saudade?
Pode ser tudo isso, mas há uma atualidade nessa reminiscência. A crise de agosto de 54, a mais dramática de nossa história, foi resultado dos terceiros escalões do poder. Nem o presidente, nem os ministros, nem os funcionários mais graduados do governo tiveram participação no atentado.
O crime foi tramado e executado por gente dos escalões mais baixos, que, apesar de subalterna, tinha acesso a gabinetes importantes da estrutura do poder naquela época.
Nada que envolvesse direta ou indiretamente o presidente, mas as heranças trazidas da campanha, alguns dos financiadores que atuavam na sombra (nada que se compare aos atuais patronos dos candidatos), desafiaram a lealdade do responsável pela segurança presidencial - e aí a bola de neve cresceu e rolou, tingindo-se de sangue no início e no fim de sua trajetória.
Não estou lembrando a tragédia daquele ano para comemorar uma data macabra. Temos pela frente mais uma eleição presidencial e é importante que o eleitorado examine não apenas os cabeças-de-chapa, mas as forças que os apóiam e, sobretudo, quem os apóia, o que querem, o que representam, como agem para alcançar seus objetivos de poder e fortuna.
Getúlio foi um dos presidentes mais honestos e austeros da República. Morreu endividado. Apesar da herança recebida de seu pai, teve de pedir empréstimo a um banco para comprar sua fazendinha em Itu. A dívida foi saldada por seus filhos, anos mais tarde.
Não basta ao candidato ser honesto. A corte que ele traz - ou que a ele se associa - precisa também ser acima de qualquer suspeita.



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