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São Paulo, sexta-feira, 05 de dezembro de 2003

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CLAUDIA ANTUNES

O espetáculo do grampo

RIO DE JANEIRO - "Alô! Vê se dá para pegar um dinheiro aí. Pega R$ 20 mil, porque eu rodei. Rapidinho, que tô na mão dos policiais." A frase faz parte de uma conversa telefônica grampeada em que um traficante, preso por policiais militares, pede que cúmplices no morro dos Macacos, na zona norte do Rio, arrumem o dinheiro para que seja liberado.
Divulgada na última terça-feira pelo secretário de Segurança, Anthony Garotinho, a gravação garantiu o espetáculo nos noticiários noturnos e o chamariz para os leitores dos jornais locais do dia seguinte.
Nos grampos da chamada Operação Transparência, como naqueles da Anaconda, policiais, magistrados, empresários, traficantes e contrabandistas se igualam na linguagem chula, na verve da malandragem, nos apelidos infames. O público, voyeur, vibra. Os "espertos" contemplam as próprias entranhas. Os que suam para pagar as contas e as prestações sentem-se vingados da justiça e da segurança que não têm no dia-a-dia.
A Ordem dos Advogados do Brasil protestou recentemente. Queixou-se tanto da "desarrazoada utilização" das interceptações telefônicas como da divulgação dos diálogos de pessoas investigadas. Não há sinal, no entanto, de que haverá recuo das promotorias ou das polícias.
No Rio, a Secretaria da Segurança comprou neste ano uma central de busca eletrônica que permite monitorar 800 ligações ao mesmo tempo. Nem a Justiça do Estado nem a Federal têm estatísticas de interceptações autorizadas, mas é possível ter uma idéia de escala quando se sabe que só a 1ª Central de Inquéritos, uma das três do Ministério Público Estadual, pede, por mês, uma média de 50 grampos. A maioria é aceita.
Há abusos e sensacionalismo, sem dúvida. Na Bahia, gravações feitas legalmente foram usadas para espionagem particular. Na Operação Sucuri, em março, 23 agentes federais presos com base em escuta foram liberados, porque as provas eram frágeis. Todo cuidado é pouco, mas o grampo, quando legal, ainda é melhor do que nada.


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