São Paulo, sexta, 6 de fevereiro de 1998

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Os "palpites" que o Brasil paga

CLÓVIS ROSSI
Madri - O presidente Fernando Henrique Cardoso pode ter suas razões para reclamar dos que considera "palpiteiros", gente que prevê um colapso mais ou menos iminente do real.
Só não pode ter se surpreendido com "palpites" do gênero, a menos que não leia os que o próprio governo paga.
Vejamos: 1) um mês, exatamente, antes de os economistas Kenneth Courtis (Deutsche Bank) e Rudiger Dornbusch (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) terem dado seus "palpites", previsões parecidas eram feitas pela Oxford Analytica;
2) um relatório dessa consultoria, datado de 29 de dezembro, dizia que "os mercados de capitais permanecerão voláteis em 1998". Três fatores causariam tal instabilidade, sendo um deles "o risco de que a crise financeira na Ásia Oriental se espalhe por outros mercados emergentes, notadamente Brasil e Rússia";
3) a América Latina, sempre segundo a Oxford Analytica, permaneceria "vulnerável a pressões sobre o vínculo entre o real brasileiro e o dólar". Mais: "Na eventualidade de uma desvalorização do real ou de uma severa recessão no Brasil, o sistema cambial argentino ficaria sob intensa pressão".
Mais um bando de "palpiteiros"? Talvez. Mas a Oxford Analytica baseia sua atuação no trabalho de cerca de mil membros dessa veneranda instituição britânica, sem falar no apoio de outras grandes universidades e institutos de pesquisa mundo afora.
O governo do Brasil (e também o francês, o norte-americano, o britânico, o alemão etc) paga por esses "palpites". E parece confiar tanto em Oxford que foi nessa universidade que se criou o primeiro centro de estudos brasileiros na Europa, inaugurado em dezembro pelo próprio FHC.
Tomara que o presidente não rompa o contrato com a consultoria. É sempre bom ter à mão alguém que lance alertas, mesmo que se revelem depois infundados, em vez de confiar apenas no coro dos que repetem em uníssono: "bonita camisa, Fernandinho".



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