São Paulo, sexta, 6 de fevereiro de 1998

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Mil desculpas

LUIZ CAVERSAN
Rio de Janeiro - O prefeito Luiz Paulo Conde recebeu ontem um grupo de jovens turistas estrangeiros, que na véspera fora assaltado quando tentava visitar o Cristo Redentor, para pedir desculpas aos visitantes.
Seria um ato de civilizada cortesia, não fosse extremamente espantoso o assalto e desastrada a passagem dos estudantes estrangeiros pelo Rio, uma vez que os dois ônibus do grupo foram arrombados e ligeiramente "depenados" em plena avenida Atlântica horas depois do assalto.
Mas a ação dos bandidos, no primeiro episódio, é o que chama a atenção: eles simplesmente bloquearam o trajeto do trem que sobe o morro do Corcovado e, de arma em punho, levaram dinheiro e bens dos apavorados aprendizes de turistas. No mínimo um trauma para a turma, visto que não houve violência maior.
Dias atrás, depois da inacreditável "operação" que gerou o maior engarrafamento de veículos já visto no Rio, Conde também fez seu "mea culpa" pelo martírio impingido às milhares de pessoas que foram (ou que pensaram que iam) ao show do grupo de rock U2, no autódromo de Jacarepaguá.
Assim como não é de responsabilidade do prefeito a segurança da população, há diversas outras vicissitudes que não lhe dizem respeito, mas depõem contra a imagem do Rio de Janeiro e pelas quais Conde, ainda que sem culpa, poderia se desculpar.
Poderia, por exemplo, pedir desculpas pela morte de duas dezenas de velhinhos em hospitais públicos. Desculpas pela morte de bebês recém-nascidos em maternidades superlotadas. Desculpas aos pedestres e motoristas que continuam sendo ameaçados pelas sandices dos ainda impunes motoristas de ônibus. Desculpas pelo menino que morreu com um tiro na nuca na praia de Ipanema, que estava lotada, mas ninguém sabe, ninguém viu.
Desculpas aos cidadãos que penam no calor deste Rio de Janeiro que ainda faz jus à antiga marchinha de Carnaval. É a "cidade que nos seduz/ de dia falta água/ de noite falta luz".



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