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TENDÊNCIAS/DEBATES
Nacionalismo e sucessão
JORGE BOAVENTURA
O patriotismo, tal como o temos
conceituado, "é o resultado da
compatibilização emocional que, espontaneamente, se estabelece entre o
ser humano e o ambiente físico e cultural em que ele veio ao mundo, desenvolveu a sua personalidade e integrou-se
no processo histórico". Trata-se, portanto, de algo que ocorre naturalmente,
não consequente a propaganda, à maioria esmagadora das pessoas, ainda que
em diferentes níveis de intensidade.
Existe, pois, um nacionalismo legítimo, que não implica xenofobia e que resulta de um maior carinho, maior interesse e mais desvelo para com as coisas
relativas à promoção do bem da nação a
que se pertença, de vez que, quando falamos de ambiente físico e cultural, estamos falando dos componentes essenciais de uma nação.
Em passado bastante recente da nossa
História, foi agitada intensamente a
bandeira de um nacionalismo geralmente centrado em temas específicos
de cunho econômico, empunhada a referida bandeira por ativistas das diferentes correntes do Materialismo dialético, substrato ideológico do comunismo moderno. Entre nós predominavam as correntes russa e chinesa, inspiradas por Moscou e Pequim, que lhe davam apoio, a primeira de maior importância e tradição entre nós e ambas empenhadas no incitamento da luta de
classes -que seria, segundo acreditavam aqueles ativistas, o motor necessário da história.
Acreditavam-se eles, também, em sua
lamentável ignorância científica, os únicos possuidores de visão da ciência, eis
que fora da dialética de contrários, tudo
não passava de alienação...
Tudo isso foi ao tempo da chamada
Guerra Fria, e o projeto de domínio
mundial em proveito de poucos era comandado pela cúpula dirigente do partido comunista da União Soviética, o
qual chegara ao poder em consequência
do apoio recebido, pasmem, do grande
capitalismo internacional, que continuou a apoiar o projeto em causa por
intermédio dos grandes negócios
-grandes na que chamamos de visão
contábil, que pode ser, e no caso era, antitética da visão histórica.
À primeira vista, parecerá absurda a
afirmação que acabamos de fazer. Parecer-lo-á menos, quando verificarmos
em autor insuspeito, Zbigniew Brzezinsky, que estimou que algo em torno
de 70% da modernização do parque industrial soviético e do aparelhamento
do Exército Vermelho provieram de negócios com corporações do Ocidente,
inclusive com transferência de tecnologia. Grandes negócios na visão contábil;
na visão histórica, a civilização ocidental estava fortalecendo a ameaça maior
que jamais conhecera -a de, pela primeira vez, a humanidade vir a se organizar sob a visão impositiva de ateísmo
militante e negador da existência de
qualquer coisa fora ou além da matéria.
Tudo isso, porém, passou, e os escravos da "visão contábil", adoradores do
"deus Mercado" abandonaram aquela
estratégia para o domínio mundial em
proveito de poucos, desmontaram a
União Soviética e passaram a adotar,
para a consecução da mesma política de
domínio mundial em proveito de poucos, a que agora chamam de "globalização". Repare o leitor: antes, como agora,
impõe-se a superação das soberanias
nacionais. E isso, não como processo
natural, a realizar-se a longo prazo, e espontaneamente, mas como imposição
abusiva e autoritária, cujos frutos amargos aí estão diante dos olhos de todos.
Por toda a parte, os valores fundamentais da nossa civilização judaico- cristã estão sendo desconsiderados
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Não nos permite o espaço disponível,
tentar detalhá-los.
Diremos apenas que, por toda a parte,
os valores fundamentais da nossa civilização judaico-cristã estão sendo desconsiderados e, por toda a parte, está
crescendo vertiginosamente a corrupção, sempre presente em todas as civilizações que nos precederam, em seus períodos de decadência. As sociedades do
chamado Primeiro Mundo podem se
entregar a um consumismo, em grande
parte desnecessário e sem sentido, enquanto as demais, empobrecidas e espoliadas, nem a esse culto ao mercado
podem dedicar-se.
Às primeiras é facultado fazê-lo, por
sediarem os centros que comandam o
processo. Ignoram os leitores que, em
nossas favelas, os traficantes de drogas
buscam suprir carências de seus moradores, de certo modo ocupando funções
que deveriam caber ao Estado? Não o
fazem, porém, por bondade, mas por
desejarem ter em suas proximidades
pessoas que não lhes sejam hostis.
Por tudo isso, diremos que o candidato que interessa à nação brasileira deverá ser o nacionalismo legítimo, consequência natural do patriotismo, representado por quem ame verdadeiramente a nossa pátria e a nossa gente. E este,
segundo pensamos, ainda não despontou no cenário sucessório; e corremos o
risco de não vir a despontar, eis que a
ambição pelo poder a alguns corrompe
e à maioria, aparentemente, sidera e
enlouquece. E tudo isso, pensamos, tem
uma causa profunda a que pretendemos nos reportar no futuro.
Jorge Boaventura de Souza e Silva, 80, ensaísta e escritor, é conselheiro do Comando da Escola Superior de Guerra.
Site: www.jorgeboaventura.jor.br
E-mail: boaventura@jorgeboaventura.jor.br
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