São Paulo, sexta-feira, 06 de agosto de 2004

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FUTEBOL POLÍTICO

A realização de um jogo de futebol reunindo as seleções do Brasil e do Haiti surge, à primeira vista, como um gesto simpático do governo brasileiro, que enviou tropas para comandar uma missão da ONU naquele país. Os haitianos encontram-se entre os numerosos admiradores do futebol brasileiro e terão a oportunidade de, pela primeira vez, recepcionar a equipe nacional.
Há, no entanto, alguns aspectos a considerar. Além dos riscos -esperemos que contornáveis- de tumultos devido às precárias condições do estádio e da segurança local, o episódio traz novamente à cena o debate sobre a instrumentalização do esporte por interesses políticos, algo que o Brasil, em tempos de autoritarismo, conheceu muito bem. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará presente à partida, que lhe servirá, se tudo correr bem, como mais um evento internacional de marketing.
Para que a idéia fosse levada a cabo, o Planalto contou com o solícito apoio da Confederação Brasileira de Futebol, numa conjunção de interesses que se pode mostrar danosa ao processo de moralização e saneamento do futebol brasileiro. Os clubes de futebol filiados à CBF devem ao fisco algo em torno de R$ 400 milhões. Muitos continuam inadimplentes sem que o governo tome as medidas cabíveis. Além disso, a CBF, alvo de CPIs que reuniram uma série de indícios de irregularidades, comanda um esporte cujos dirigentes descumprem acintosamente a nova legislação esportiva - justamente o primeiro conjunto de leis sancionado, em 2003, pelo presidente Lula.
Para tornar o quadro mais lastimável, o ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, tem sido um exemplo de inapetência quando se trata de zelar pelas normas vigentes e enfrentar as forças que dificultam a mudança da gestão do futebol, na qual a incúria administrativa não raro se entrelaça com a imoralidade e a corrupção.
Será deplorável se essa partida, como sugerem alguns fatos, selar uma aliança entre a CBF e o petismo, do qual se esperava, também no esporte, um pouco mais de coerência com as manifestações moralizadoras dos tempos de oposição.


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